sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Lucidez



           Sou fã das teorias da conspiração, não porque acredite nelas, mas porque acho que elas dizem muito sobre quem nós somos enquanto sociedade e nossos desejos individuais. Elas criam a possibilidade da existência de um outro mundo, afinal, esse aqui é chato demais.
            É mais legal acreditar que a chegada do homem à Lua foi uma armação americana, ou que o mundo é controlado por uma sociedade secreta, ou que Michael Jackson forjou a própria morte e está escondido em algum lugar, feliz e curtindo a vida no anonimato.
            Quem segue essas teorias tem praticamente o mesmo espírito de pessoas que acreditam até hoje na mitologia grega, por exemplo. Ou dos que acreditam na influência dos signos. Vai da fé de cada um, e quem sou eu para criticar? No entanto, mesmo histórias totalmente ficcionais (como Star Wars, Harry Potter ou Senhor dos Anéis) guardam os seus 'fiéis'. Como explicar?
            É a possibilidade de desvendar esses universos secretos que alimenta as teorias da conspiração. Afinal, quem não quer ser o herói que sabe o que ninguém sabe e revela grandes mistérios? A excitação de ser o "arauto da verdade" muitas vezes é incontrolável.
            O problema é quando a imaginação passa a se sobrepôr a verdade. Um torcedor que diz que o Brasil vendeu a Copa está preferindo o conforto da mentira do que a dor de perceber que não fomos capazes de ser campeões. Abre-se a brecha para que um Trump vença a eleição dizendo que aquecimento global não existe. Crescem ideias como "nazismo de esquerda", "terra plana", olavetes e bolsominions. O conhecimento técnico e científico perde força para o senso comum.
            Quando eu era criança, gostava de imaginar que estava em outros lugares, outras épocas, outra realidade. Era divertido, mas sabia que era apenas uma brincadeira. Tomara que os adultos também consigam manter sua lucidez. Ou será que já é tarde demais?

Polycarpo Quaresma

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