quinta-feira, 13 de junho de 2019

Gaia

Música: Onaagh - Gäa

O sol ainda não nasceu, e eu tive que pular as grades de proteção para entrar no parque. Graças a pouca luminosidade, tudo que vejo são sombras desformes, mas sei que na verdade estou rodeada de árvores de diversas espécies espalhadas pelo gramado, que aqui e ali dá lugar a arbustos floridos. Pego o celular pra checar a hora: 6h12min, o sol está quase nascendo. Junto com o telefone, meus sapatos são descartados em um canto qualquer. 
   Inalo profundamente e fecho os olhos. Toda a minha atenção se volta para a sensação dos meus pés tocando a grama, úmida por causa do orvalho. Mexo os dedos dos pés e sinto uma textura áspera, porém reconfortante. Exalo. O vento gelado do finalzinho da madrugada toca minha pele, causando um arrepio que percorre todo o corpo. Ajeito minha postura. Pés separados na distância do quadril, palmas das mãos voltadas pra cima e separadas do corpo, topo da cabeça voltado pro céu. 
Tadásana, postura da montanha. 
   Aterre-se.
    Ainda de olhos fechados, consigo perceber a claridade que aumenta pouco a pouco. Ao abrí-los, lá está o sol, espalhando seus raios por aí, ainda de forma tímida. O céu começa a mudar de cor, o brilho das estrelas fica pálido com a vagarosa chegada do astro-rei. Embora comparar o brilho dos meus olhos a ele seja ridículo, sei que provavelmente demonstram fascínio completo. Poder contemplar esse espetáculo todos os dias talvez seja o maior presente que qualquer ser humano já recebeu. 
Súrya Námaskara. Saudação ao sol.
    Energize-se.
    Assim como o sol renasce, as outras coisas também. Aos poucos, é possível ouvir o som dos pássaros, insetos e outros animais se agitando. O canto de diversas aves, o bater das asas de uma abelha, as folhas que balançam com o vento... Os sons do ambiente se juntam ao mantra que eu entoo quase inaudivelmente. Loká samastá sukínô bávantú. Que todos os seres vivos vivam felizes e em paz, e que a minha existência contribua para isso.
    Inalação profunda. O cheiro de terra molhada e das flores recém desabrochadas invadem meu nariz. Exalação longa. Respirar fundo, sentir o ar frio entrando pelas narinas na inspiração e o ar quente saindo na exalação, prestar atenção em todos os odores. Estar no aqui e no agora
    Pertença. 
    A pausa para a água não desvirtua a prática. Desfruto de cada segundo que o líquido fresco permance em minha boca. Algumas gotas escorrem da garrafa e caem sendo atravessadas pelos raios de luz. É mais uma das coisas simples e de beleza absurda. 
   Seja grato.
    Cada movimento é feito com calma e fluidez. Alongar, torcer, sustentar. Cada postura carrega consigo um significado, cada transição é feita compassadamente com a respiração profunda e consciente. Viver o presente, olhar para dentro de si mesmo e também pra fora. 
   Conecte-se.
    Perco a noção do tempo e quando julgo já ser hora, me deito sobre a grama. Shavássána, postura do relaxamento final. Deixo todo o peso do corpo ir em direção á Terra, permito que os pensamentos fluam sem prestar atenção neles, e me foco nas coisas ao redor. A grama em baixo de mim, o vento tocando minha pele, o canto dos pássaros, o cheiro das flores...As sensações me inundam completamente. Não há passado ou futuro, há apenas o agora. A maior das sensações é, na verdade, uma certeza: a natureza é luz e vida, e eu faço parte dela. 
    Somos todos unidade. 

Namastê,
Leena Charpentier

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