quinta-feira, 28 de março de 2019

Sem Título 2

Era de se esperar que mais de duas horas fosse um tempo considerável 
para realizar uma atividade. Em duas horas, o aluno de cinema assiste seu 
quinto longa-metragem do mês. Em duas horas, o professor tira uma soneca ou o mais próximo que terá de uma noite de sono. Nos dias atuais, tudo demora ou passa muito rápido, mas pode se dizer ser um consenso: três horas em uma viagem diária é tempo demais. Em pensar que ele acorda com o sol, ajeita roupa e a cara amassada como outrora se programou. E se repetiu tanto que já se move no piloto-automático até entrar no próprio carro. Nada muito luxuoso, mas algo que resista aos buracos que encontra no asfalto pelo 
caminho. Quantas discussões a gente se trava durante o trajeto casa-trabalho em uma ida. A volta é assunto para mais tarde. Ouvindo tanta fumaça no rádio, elaborando tantas revoltas por sempre tentar conceber a realidade material e ideológica do mundo. Interessante pensar que iria um dia encontrar meu professor do ensino médio e, logo em seguida, do cursinho, sentado na mesma sala que declamando os mesmos dilemas e as mesmas tensões. Coisas que pensei ser medo de gente grande, sabendo, muito embora, que adultos não sentem medo. Ele continua a dirigir por quatro cidades todos os dias, continua a apoiar a bolsa sobre mesa e a cumprimentar a todos nos seus melhores dias, para, então, finalmente dissertar sobre aqueles mesmos dilemas e tensões aos 
que se propuserem a ouvir. Ou seriam três horas de puro prazer como um 
combustível diário ou um momento de autocuidado. Como quem diz para 
deixar o sofrimento para depois e aceitar que 260 minutos ereto e atento já é exercício demais para um só corpo. Há quem diga ser uma forma positiva de se enxergar a vida. Entre copos meio cheios e meio vazios, estamos todos no mesmo barco.
Dominique Casanorte

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