quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Bomba-relógio

 Sempre tive muitos medos. Na infância o que mais me assombrava era não saber o que podia estar na escuridão, me lembro de odiar dormir sozinha e sempre terminar a noite na cama da minha mãe. Conforme eu fui crescendo, pude perceber que as piores coisas do mundo nem sempre estão no escuro. Meu medo criou galhos e raízes, cresceu para um novo caminho. Já um pouco maior, iniciei em uma nova escola e o meu maior temor passou a ser não conseguir fazer novos amigos. Tenho guardado na mente ainda hoje o meu primeiro dia de aula do ano de 2010, a timidez estampada no meu rosto enquanto minha tia dizia que estava tudo bem e que me encontraria no mesmo lugar no fim do dia. Isso passou. A ansiedade que tive naquele dia ri de mim nos dias de hoje, pois no final da tarde realmente estava tudo bem.

Quando fiz 11 anos, meu medo premeditado passou a ser a despedida. Nessa idade, eu vi a pessoa que mais me apoiou se esvair e ir embora aos poucos. Vivenciei a dor de ver quem eu amo sentir dor e constatei a minha insignificância ao não poder fazer nada quanto a isso. Vi seu corpo se tornar sua própria bomba-relógio, vi as dezenas de idas e vindas ao hospital e as tentativas frustradas de não conseguir fazer as mesmas coisas de antes. Vi o esquecimento e com ele a dor da certeza de que tinha algo errado. Então, por mais um dia, vi sua ida ao hospital, mas daquela vez não vi a volta. Não a encontrei no mesmo lugar no fim do dia.

Desde então meu medo tomou outra forma. Agora temo a saudade. Descobri na arte, na escrita, em maior parte, uma forma de lidar com partidas e despedidas, esperadas ou não. Coleciono cartas, poemas, versos, parágrafos e memórias de pessoas que foram à terra e de outras que ainda andam na Terra, mas que escolheram, por livre e espontânea vontade, viver para longe de mim. Às vezes me pergunto se também não sou minha própria bomba-relógio. Sigo tendo medos, mas, afinal, acho que é isso que me torna humana. Outrossim, espero que a saudade seja ínfima perto das histórias que vivi – e vivo, enquanto meu cronômetro ainda conta. Que seja linda a vida que antecede à explosão e ao adeus.

- Rory Gilmore

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