sexta-feira, 4 de outubro de 2019


Informalidades


Tudo aconteceu entre as quatro paredes da sala de reunião. Final de expediente. Os corredores vazios. Os cubículos sem sinal de vida com a luz de fim de tarde. Uma ou duas pessoas passando rápido em direção ao elevador com o principal intuito de ir pra casa o mais rápido possível.
Na sala estava ele: o AVÔ. E ele: o NETO.
O primeiro era um homem de cabelos grisalhos, com postura imponente e capaz de desafiar bandos e bandos de acionistas com unhas e dentes sem sequer desalinhar um único fio de cabelo, ou perder a compostura. Era o fundador da companhia. O exemplo a ser seguido de ordem e formalidade. Havia também um boato de que o AVÔ escondia sua fama de mulherengo por trás da carapaça de homem dos negócios. Mas ninguém nunca tinha conseguido arrancar nada que comprovasse ou não a teoria.
O segundo era um jovem pré-adolescente. Tão inseguro que se achava dono das respostas do universo. Um mar de hormônios e contradições que a cada onda, sua inquietação aumentava. Foi justamente o último tsunami que o levou para aquele instante incômodo que ele próprio tinha causado.
Ele: o NETO queria todos os detalhes possíveis de como era uma transa na vida real e ele: o AVÔ, queria desaparecer da sala quando ouviu do que se trataria a conversa. 
O patriarca da família apertou a gravata no colarinho, obrigando todo os poros do pescoço a redirecionarem o suor para outras partes do corpo e se pôs a olhar seu reflexo no vidro fumê da longa mesa de mogno. O AVÔ se levantou, mantendo a postura ereta, e esticou braço até o alto da porta. Pegou o crucifixo que estava preso na parede e guardou na gaveta do aparador. Voltou para seu lugar hierárquico na ponta da mesa e encarou ele: o NETO.
O NETO reforçou que queria saber tudo. TUDO. Sem pôr nem tirar. Ou pondo e tirando com certa frequência, como sua mente ávida em trocadilhos ruins tinha imaginado. Foi então que o homem pensou em todos os eufemismos possíveis para pênis e vaginas, decidindo contar um caso que poderia ser real, ou não, para ilustrar o assunto.
O relato começou com um RAPAZ e uma MOÇA andando de mãos dadas por um jardim. Eles se sentiam muito bem com a presença um do outro. Conversavam por horas e horas afio e o tempo parecia correr mais depressa ainda quando estavam juntos. Pode parar aí. Eu disse que queria saber como é na vida real, não como é na bíblia, ou em filmes de Hollywood. Reclamou o NETO. Então a história mudou. O dia ensolarado com pássaros voando virou uma noite de chuva e relâmpagos. O quarto perfumado e elegante que nem tinha aparecido ainda era um carro velho de duas portas. O RAPAZ e a GAROTA estavam dentro dele. O AVÔ mudou a personagem feminina e disse que eles pouco se conheciam, mas se beijavam no banco de trás. Estavam sentados, virados um de frente para o outro. As mãos inquietas entrelaçavam a cintura da GAROTA e o rosto do RAPAZ. Ele começou a deslizar a mão pelas costas dela em direção ao pescoço. Os dedos percorriam a pele suavemente até alcançarem a nuca, enquanto a outra mão ia em direção a barriga. A respiração da GAROTA tinha ficado mais frequente e ela se aproximou do corpo dele. Nesse momento, as pernas se encontraram e uma também se enlaçou na outra.
Os vidros do carro, levemente embaçados, pareciam ainda mais foscos e apenas o som das gotas de chuvas vinham do lado de fora. Mas dentro haviam ruídos distintos. Um leve som dos lábios da GAROTA, ressoaram do pescoço que ela beijava. Os batimentos cardíacos dele também tinham aumentado. Ela conseguia sentir enquanto deslizava a mão pelo peito do RAPAZ em direção à calça. A GAROTA também sentiu uma onda de calor entrando por debaixo de sua blusa e subindo até o pescoço. O ruído seguinte foi a fivela do cinto dele se abrindo enquanto a segunda onda invadia o corpo dela pelas costas. As duas mãos do RAPAZ então, se encontraram na frente, junto aos seios da GAROTA. Ele não tirou o sutiã? Queria saber o NETO. Ela não estava usando. Completou o AVÔ. Mas podemos fingir que estava, e continuou. Então A JOVEM usava um sutiã. E o AVÔ tinha trocado a personagem outra vez.
A JOVEM usava um sutiã e o RAPAZ tentou abrir. As mãos dele percorreram toda a alça da peça íntima até as costas. Ela ajeitou a postura e abriu um sorriso enquanto olhava nos olhos dele. As mãos dele se posicionaram no fecho e com certa dificuldade, conseguiram soltar os pequenos ganchos que os prendia. O sutiã se abriu e ele passou os dedos suavemente pelas costas da JOVEM até voltar aos seios. Eles eram macios? Interrompeu o NETO outra vez. Claro. Os mamilos dela estavam durinhos, não estavam!? Significa ela tá gostando, né!? Os seus também ficam mais ou menos assim. Concluiu o AVÔ que começava a achar as interrupções cada vez mais irritantes.
A história entre o RAPAZ e a MOCINHA prosseguiu. A chuva do lado de fora tinha diminuído. Uma parte das roupas dos dois estava espalhada pelo carro. Eles tinham se deitado no banco de trás com parte das roupas íntimas ainda presas ao corpo. Assim como antes, trocavam beijos com as pernas entrelaçadas, mas agora as costas da MOCINHA estavam contra o tecido do banco e o RAPAZ deitado por cima dela. Ele vestia apenas uma cueca box muito justa. Tão justa que era possível ver que seu membro estava ereto. Mas e se não estivesse? Uma nova interrupção. Aí eles continuariam se aconchegando até estar, ou tentariam outra coisa. Resumiu o AVÔ. E que outra coisa seria essa? O NETO sugeriu masturbação. O AVÔ apontou que existem outras formas de fazer sexo que não envolveriam penetração. O NETO falou pra incluir isso na história e a cena dentro do carro mudou. A personagem também.
A MULHER estava sentada no banco de trás com as costas na janela. Um dos braços atravessava o encosto. Seu corpo se movimentava levemente, seguindo um ritmo, uma frequência leve. Estava de olhos fechados e os cabelos um pouco fora do lugar. O RAPAZ segurava umas de suas pernas com as mãos, afastando o joelho de perto da cabeça dele. A outra mão, deslizava na direção de um dos seios enquanto ficava com o rosto abaixo entre as pernas da garota, fazendo movimentos contínuos com a língua. Aos poucos, os movimentos abdominais dela ficavam mais constantes e profundos. A MULHER permanecia com os olhos fechados para se concentrar no que estava acontecendo no momento.  De tempos em tempos, o RAPAZ a olhava de baixo, esperando alguma ação, ou indicação do que deveria fazer, mas nada era transmitido para além de uma mistura entre agonia e prazer. Ela apertou o estofado com força e o movimento foi se intensificando. Pediu de forma quase inaudível para que o RAPAZ continuasse o que estava fazendo. Ele a olhou e prosseguiu movimentando a língua no mesmo ritmo em que ela se mexia e na mesma frequência em que seu corpo vibrava, cada vez mais intenso e forte até que o NETO quebrou o clima. Ela ia gozar? O AVÔ brochou e desistiu da história. 
O homem de negócios se levantou e disse para o NETO conversar melhor com outra pessoa sobre o assunto. Alguém mais experiente. Saiu da sala em passos firmes e voltou. Pediu para o NETO colocar o crucifixo no lugar. O jovem se levantou, foi até o aparador e abriu a gaveta. Lá estava o objeto religioso, como era de se esperar e algo mais além dele. Um porta-retratos com uma fotografia em preto-e-branco. Nela, estava ele: o AVÔ e o pai dele: o BISAVÔ. Estavam em frente à uma grande casa elegante com jardim e um carro velho de duas portas. Mas elas não estavam lá. Nem A MOÇA, nem a GAROTA, nem A JOVEM, a MOCINHA ou a MULHER.  Aparentemente só existiam nos boatos sobre o AVÔ e nas histórias que ele “inventava”.
O NETO colocou o crucifixo no lugar e se sentiu orgulhoso com o objetivo cumprido. Boatos não precisam se esconder em posturas imponentes, ou formalidades falsas. A menos que sejam verdade.

P.J. SOUZA


5 comentários:

  1. Adorei a forma que você encontrou de descrever o que foi proposto. Além de criativo, atendeu ao que foi pedido. Ótimo texo!!!

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  2. É super interessante como você constrói uma história de sexo sem necessariamente narrar uma cena de forma direta. Foi uma grande sacada trabalhar com a questão da oralidade passada pelos mais velhos, a figura do Neto funciona perfeitamente para se conectar com o próprio leitor que também fica curioso com o que será dito pelo Avô através da expectativa que é criada ao longo do texto. E mais uma vez entrega um excelente final com uma boa reflexão.

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  3. Quero aproveitar esta oportunidade para agradecer ao Dr. Padman. por me ajudar a recuperar meu amante depois que ele me deixou alguns meses atrás. Enviei amigos e meus irmãos para implorar por mim, mas ele recusou que tudo acabasse entre nós dois, mas quando conheci o Dr. Padman. ele me disse para relaxar que tudo vai ficar bem e realmente depois de apenas dois dias eu recuperei meu homem. muito obrigado Dr. Padman. aqui está o e-mail desse grande homem, se você precisar da ajuda dele, pode entrar em contato com padmanlovespell@yahoo.com

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  4. A forma de narração e a mudança de substantivos foram estratégias bem colocadas, dão ritmo, evolução, um amadurecimento ao longo do texto que é bem propício ao tema proposto, e o final é surpreende pois há uma ruptura do ritmo e da evolução, mas o amadurecimento permaneceu.

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  5. Totalmente diferente do que eu imaginaria ler com o tema sexo.Me surpreendeu.Achei bem fluido e consegui imaginar cada detalhe do texto.Muito bom mesmo!

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