sexta-feira, 14 de setembro de 2018

O peladão da academia

Caro leitor, começo esta crônica com um pedido de desculpas. A crônica de hoje fala sobre
sonhos. Eu iria adorar ter algo interessante pra escrever sobre, um sonho instigante que
deixasse a todos curiosos se perguntando o porquê das coisas acontecerem de tal forma ou
um sonho com teor bem filosófico, que produzisse questionamentos interessantes, deixando
aquele ar de inquietação no leitor ao fim da leitura. Algo como o filme A origem, Quando
estamos sonhando e quando o sonho passa a ser realidade ?
Infelizmente não lembro de ter tido um sonho tão profundo, e seria injusto com você, caro leitor,
se eu estivesse inventado um sonho que não tive, então vamos lá. Era uma tarde, eu não
lembro exatamente todo o enredo do sonho, como eu fui parar na situação em que eu estava,
mas só sei que aconteceu. Eu me encontrava na academia, deitado no banco fazendo um
supino reto, do meu lado direito um haltere de 10kg, a mesma coisa do esquerdo. Ainda
deitado eu me inclino, pego os dois e começo o meu exercício, halteres pra cima e para baixo.
Começo a sentir meu músculo fadigando, de repente olho para o lado e vejo que todos ao
redor estão me observando, olho para baixo e descubro que estou totalmente despido e que
meu braço não era a única parte do meu corpo que subia e descia acompanhando o
movimento do exercício.
Eu a principio fiquei meio envergonhado com a situação, mas eram olhares diferentes, de
admiração. Por incrivel que pareça não recebi nenhum olhar de julgamento. Pasmém, até os
funcionários da recepção abandonaram seus afazeres para acompanhar a sincronia perfeita do
exercicio. De repente até Leonardo Da Vinci aparece no sonho, ele fica observando e comenta
com os outros marombas da academia que está de frente com o homem vitruviano do século
XXI.
Os companheiros de academia, estupefatos com a cena, começaram a filmar o ato. Colocaram
nas redes sociais, milhares de comentários e compartilhamentos. As pessoas começaram a
achar que era uma performance artística, de repente eu saio da academia e manifestantes
conservadores juntos do mbl estão com tochas querendo colocar fogo na academia. Ficaram
invocados com o novo homem vitruviano, cairam em fake news e acreditaram que de fato meu
supino era uma obra de arte e eu estava querendo perverter a sociedade com isso. Será que o
que eu tive foi realmente um sonho ? ou uma sátira da realidade ?

Pierrot
Ontem eu sonhei que estava em Moscou, dançando pagode russo na boate Kossacou. Cantou né? Sinceramente, eu queria que fosse bom assim. O sonho que tive essa noite foi muito estranho. Eu sonhei com Ana, uma mulher na qual não simpatizo muito. No começo do sonho, eu e minha família estávamos numa empresa resolvendo negócios, uma empresa moderna, com vários equipamentos de última geração. Todos estavam felizes, dando gargalhadas, bebendo refrigerante, comendo pizza, inclusive acordei com vontade de comer. Enfim, era um momento feliz, até que o elevador faz "plim" avisando que chegou alguém. Era Ana, ela chegou com ódio, sabia que eu não gostava dela. Mirou em mim e disse: - Hoje, eu acabo com você. 
Ali, começou o caos, o fim do mundo. Ana parecia filha de Poseidon, a empresa começou a encher de água. Todos ficaram desesperados tentando fugir. Me perdi da minha família quando eu fugi, peguei o elevador e fui parar no subsolo. Cheguei lá com um amigo, nos abrigamos. Depois de um tempo, vimos uma porta e resolvemos abrir. Estava tudo mil maravilhas, estava acontecendo uma festança. Do nada, eu vejo minha ex chegando, mas o mais estranho é que ela estava junto com a minha namorada. Sério, isso é inviável. Eu cheguei, falei com elas e as amigas delas que estavam juntas. Beijei minha atual, só que ela saiu e disse: - Tá louco? Você namora a Beatriz é quer vim me beijando, ela é minha amiga safado!
Eu ainda estava com a minha ex no sonho, a Beatriz, que bizarro. Pra piorar, subi para o segundo andar da casa onde a festa tava rolando e fui pensar. Chegando lá, a minha atual da vida real, veio atrás e disse: - Oi amor, tudo bem? Vamos ficar aqui, estava com saudades. Olha só, vi que aquela Beatriz curtiu sua foto, depois a gente conversa.
Ela me puxou e ficamos nos beijando até o fim do sonho. Eu acordei depois disso e até agora eu não entendi absolutamente nada. Só tenho uma coisa a dizer. Xô Beatriz, xô Ana!

DJ Rogerinho Do querô

TEENAGE DREAMS

Não encare esse texto como uma narrativa. É apenas uma crônica sobre amor. Mas, como uma doença crônica, também, saiba que não te dou esperança. É como uma dor, ou talvez então, é de fato uma dor, sem comparações.  Na real, sofrer foi apenas grande parte do processo de te amar. Amar foi parte intrínseca do começo de te perder. Confuso, sim, mas talvez uma linha temporal nos situe. 
Daquele match, não tive nenhuma ideia. Das tuas piadas, senti algo ascendendo. Teus princípios nos encaixaram. Quem disse que política não se mistura com amor não participou de nossas discussões sobre comunismo.
Como você começou a aparecer nos meus sonhos? Freud explica. Eu não. Um verdadeiro númenoEróticos, românticos, trágicos, infinitos. E quando ao acordar eu via você me versó Deus e Freud conseguem mensurar o quanto me apaixonei. 
A decisão de te amar mais e mais foi feita. Assim como sua ida pra outro estado. Desculpe o palavreado, mas FODA-SE o planalto! Desolado. Interrompido. Assassinado. Mas, acendido. Como uma vela de sete dias, que durou meses, aromatizado com o perfume da saudade, em meus sonhos, você era a estrela de Bollywood. E Hollywood. 
Em formato de leão, ou me salvando de tubarões no deserto, você estava lá. Assim como no final da rua, num fim de tarde, até perceber que era só o Gustavo, só mais um caucasiano. 
Aos 17 pude viver a primeira desilusão amorosa. Os sonhos mudaram desde sua ida. Agora, quando aparece,me sinto como naqueles pontos turísticos do Rio de Janeiro que fomos juntos após nossa separação. Desvalorizado, cheio de história, porém, necessário. 

Alaska Pett

sábado, 1 de setembro de 2018

Quando der, quando puder

Naquele sábado, estava de pé antes das 7:00h. Lembro que acordei mamãe e insisti pra que me deixasse usar o macacão florido que havia ganhado dele no último passeio, há quase três meses.
Na noite anterior, avisou que me buscaria logo cedo. 
Passei a manhã toda no quintal esperando, enquanto mamãe me observava da varanda. E quando entrei pra almoçar já era tarde. E eu chorava muito. 
Tinha medo que ele achasse que não tinha ninguém em casa, como me disse que ocorreu da última vez.
Acordei com a minha mãe impaciente ao telefone. Já estava de noite e ninguém havia aparecido ou sequer dado alguma satisfação. 
E essa situação virou rotina.
Às vezes, quando nos encontrávamos por acaso, ele dizia estar com muito trabalho, estudando ou que estava sem tempo. Que me buscaria assim que desse e quando pudesse. E eu não entendia porque nunca dava. 
Mas acabei aprendendo aos poucos, a lidar com ausência. 
Há alguns dias soube por uma colega, que ele vai se casar. E que terá um filho. E o meu maior desejo pra essa criança é que ela tenha um pai sempre. Não só quando der ou quando ele puder.

CastroADez

Montanha-russa


Ela não lembra quando começou. Era algo tão comum em sua infância que muitas vezes pensava que aquilo era uma demonstração de carinho. O pai dela era um homem bom, engraçado, todos do bairro o conheciam, por isso ela não achava aquilo errado. Mas ao mesmo tempo se questionava porque ele sempre dizia: “Não conte para ninguém, isso vai acabar com a nossa família. Se sua mãe souber, ela vai chamar a polícia. Você quer ter um pai na cadeia?”.
Ela tinha onze anos na última vez que aconteceu, foi em um final de semana que ficou sozinha com o pai porque a mãe estava viajando. Depois daqueles dias, ele nunca mais encostou nela. A menina passou a viver mais aliviada, só que as marcas a acompanham até hoje.
A erotização que sofreu quando criança fez com ela não conseguisse se relacionar com os meninos na juventude. O abuso criou um sentimento de insegurança e até hoje ela tem dificuldade de confiar nas pessoas que se aproximam. Afetou também a autoestima da menina, faz com se sinta em uma posição inferior às outras pessoas, não a deixa se sentir capaz de realizar coisas que é apta a fazer.
Ao longo desses anos, a depressão foi uma companheira, é como se a vida fosse uma montanha-russa. Tem dias difíceis que ela não consegue sair da cama, se arrumar e ir para o trabalho, mas têm dias que acorda animada, ajuda organizar a casa e faz coisas que lhe dá vontade de continuar vivendo. É uma guerra constante contra o passado. É uma guerra constante contra as lembranças que assombram a memória.

Regina Phalange

Meia-noite.

A noite não parecia tão fria para o jovem que estava sentado à mesa daquele bar há horas. Já havia perdido a noção de quantos copos, das mais variadas bebidas, havia ingerido. Sua vida estava uma verdadeira loucura, nada mais fazia sentido. Havia perdido o emprego e sua recém esposa havia lhe deixado. O motivo? Estava cansada das traições feitas pelo mesmo. Seu estado sóbrio já era estar fora de sua própria sanidade. Havia se envolvido com alguns amigos, amigos no qual sua mãe sempre repreendia. Todos os desvarios começaram a fazer um verdadeiro sentido em sua mente. Ela está com outro. Ela te trocou por outro. Não quis saber de mais nada, bateu na mesa e pediu a conta. As coisas não ficariam mais daquele jeito, afinal, eles têm uma criança para cuidar. Uma pequena criança qual dependia de suas vidas para que crescesse da melhor forma possível. Era isso o que ele queria para a sua pequena criança.

 Se ela não ficar comigo, não ficará com mais ninguém.  Sussurrou para si mesmo. E na sua mente logo veio a imagem daquele objeto, presente de um de seus novos amigos. É, aqueles mesmos que sua mãe repreendia.

 Pegou a bicicleta e pedalou até sua casa, lugar onde o cheiro e a essência de sua ex ainda estava presente. A verdade é que a gente nunca sente falta das boas pessoas até que elas se vão. E ele sentia sua falta. Sentia miseravelmente a falta daquela mulher, que já estava seguindo sua vida. Abriu a última gaveta do guarda-roupa, seu melhor esconderijo para uma pistola. Nada muito luxuoso, mas que poderia fazer um grande estrago. Saiu desesperado pela casa, aquele era o seumomento.
Seu corpo estava tão quente que mal conseguira sentir o vento frio batendo contra sua face. Sabia exatamente ondeela estaria, e suas pernas nunca pareceram tão fortes por pedalar tão rápido. Estacionou sua bicicleta em qualquer canto e foi o momento imperfeito para chegar juntamente com a jovem que estava acompanhada. E não que houvesse algum problema nisso, pessoas mudam, sentimentos mudam, mas o que ela não esperava era que aquele homem no qual havia estado por alguns anos, mudaria tanto.

 O ciclista pôde sentir o coração cair até o estômago por ver tal cena, o que fez com que sua revolta crescesse mais dentro de si. Aquilo não era possível, ela era dele. Sua voz era estridente naquele bairro, mais de onze da noite, muitos já estavam em seus profundos sonhos, mas que fora suficiente para acordá-los. Ou melhor, assustá-los.

 Ameaças foram feitas, o jovem gritava para os quatro cantos daquela rua que iria matá-la, ela estava apavorada. Não podia acreditar que aquilo estava acontecendo ali, não podia acreditar que estava sendo personagem daquela história real. A arma apontada em sua direção. As mãos do jovem tremiam, nem ele sabia o que estava prestes a fazer, mas não aguentava mais. Como suas palavras foram jogadas contra aquelas pessoas que estavam ali assistindo tal cena, dois estalos ecoaram. Seu dedo havia ido de encontro ao gatilho disparando contra o ar duas balas perdidas. Por sorte para a moça, não a atingiu, mas atingiu ao seu ente próximo.Merda! Aquilo não poderia estar acontecendo. A pequena criança que estava imersa em seus sonhos conseguiu ouvir todo o barulho que vinha do lado de fora, fora acordada no susto com toda a movimentação que vinha do lado de fora. Não sabia exatamente o que estava acontecendo, mas sentia que não era algo bom. Sentia lá no fundo de seu âmago infantil e ingênuo. O mesmo jogou-se no chão, não pensou em fugir. Só estava ali, incrédulo do que tinha feito. Não era pra isso que sua mãe havia lhe criado, aquilo não fazia parte de si. E pôde ouvir a grande movimentação que se formara por ali. Com as mãos na cabeça se questionara qual seria o seu futuro a partir dali. Seria preso? Ele iria se matar? O que as pessoas pensariam? Sua pequena criança teria vergonha de si? Ele não sabia, mas um pouco desse futuro incerto começou a fazer sentido quando viu a luz vermelha distante chamar atenção de seus olhos pretos. Ele não fugiria, iria assumir sua responsabilidade atrás das grades.
Billie Jean. 

Crescimentos

O zumbido constante desse bicho desconhecido, bem no meu ouvido, me faz questionar essas empresas caríssimas de dedetização. Não consigo sequer me concentrar na crônica do dia. O deadline me cobra pressa e esse zumbido atravessa todo o meu repertório gramatical. E literário. Pra quê paguei tão caro para limpar esse apartamento? Parece que vivo numa floresta, um homem não consegue trabalhar assim. Me lembra daquela casa em Teresópolis que meu pai costumava me levar quando criança. Ou aquele sítio depois de Parati. Ou qualquer lugar em que ele estivesse, traz essa lembrança, esse gosto, esse som. O zumbido constante desse bicho desconhecido, bem no meu ouvido, talvez venha de dentro. E me faz questionar onde aquele homem e aquele menino (que eu era) estão. Quero ligar para o pai e perguntar da onde vem meu medo de inseto e escutar alguma história atrapalhada e em muitas partes inventada, que me traga aquela paz infantil. Entender o porquê não consigo escrever e porque é tão difícil saber de tudo. Abro o jornal todos os dias e vejo estupros, mortes, assaltos e tudo, tudo isso faz e não faz parte da minha história. O zumbido constante desse bicho desconhecido, bem no meu ouvido, são meus traumas me lembrando de que seguir crescendo é preciso.

Ricardo Reis