- Não sei dizer bem ao certo quando nossa relação começou a dar errado - digo
encarando a expressão amena da psicóloga. - Na verdade, eu nem queria vir, ela que me
obrigou.
- E isso te deixou irritada?
- Claro! Quem não ficaria irritada com isso? - respiro fundo e fico encarando fixamente
um pequeno abajur no canto da sala.
- Não sei se você tá irritada com ela por causa disso.
- Por quais outros motivos eu estaria?
- Não sei, me diz você.
- Não sei se conta, mas eu ultimamente não tô gostando de nenhum filme que ela
escolhe pra gente ver.
- Conta. O que mais?
- Todas as músicas que ela coloca pra ouvir no carro eu acho insuportáveis. E me tira do
sério quando a gente faz uma receita e ela coloca ingredientes que não tão na receita,
não tem sentido!
- Mas ela sempre fez isso?
- Sempre! E só começou a me irritar agora – paro por alguns segundos antes de
continuar – Sendo muito sincera, muitas coisas que ela andou fazendo tem me irritado.
- Tipo?
- Foi meu aniversário semana passada, e ela me deu uma blusa que eu não gostei, e isso
me estressou.
- E a blusa era feia?
- Não sei, era normal, eu acho. Ah! Ontem mesmo, ela fez um doce que ela faz toda
semana, custa variar?
- E você fala sobre essas situações com sua mãe?
- Às vezes eu falo, quando me incomoda muito. Nossa relação... sei lá, é tipo quando
colocam banana verde no forno pra ficar madura, sabe? Mas não tem motivo pra coisas
tão pequenas me deixarem assim, tem?
- Ter, tem. Mas e aí?
- Eu falo, a gente briga, nossa relação se desgasta, e eu acabo indo pra casa do meu pai.
Foram tantas briguinhas dessa, bobas sabe? Aí decidi ficar permanente no meu pai e
falei com ela.
- E aí?
- E aí vim parar aqui.
Asas de ícaro