sexta-feira, 31 de agosto de 2018

A noite mais escura

O relógio marcava 23:53. Todos na casa já haviam ido dormir. Como de costume, o
menino Arthur se levantara para buscar um copo d’água na cozinha. A luz estava acesa.
Seu pai andava de um lado para o outro, enquanto esbravejava algumas palavras de
desespero ao telefone. Era o terceiro emprego no semestre que o homem perdia. A
situação se dificultara ainda mais, a casa estava hipotecada, em breve a família não teria
um teto. O senhor largou o aparelho e, com as mãos sobre a cabeça, viu a desesperança
tomar seu coração. Com um semblante marejado, olhou para o lado e acendeu um
cigarro. As mãos tremiam, a cabeça fervilhava, o suor era gelado. Encarava o céu
escuro, ao mesmo tempo que seus problemas passavam por sua cabeça como lâminas
afiadas. Não existia mais luz.
Naquela altura, a janela parecia ser a solução mais fácil. Resolveu escrever uma carta
de despedida. Precisava explicar, de alguma maneira, a tragédia que estava por vir.
Assim que terminou, dobrou-a, colocou-a de lado fez o sinal da cruz. Deu um passo à
frente. Seu filho assistia à cena de filme de terror que se concretizava. O pânico engolia-
o vivo e sufocava seus gritos e choro. Estava imóvel, seu mundo desabara. Pegou a
carta, lendo-a com muito cuidado. As primeiras lágrimas começaram a escorrer. O
jovem não conseguiu abandonar o local do incidente aquela noite. Permaneceu sentado
até o amanhecer no chão frio, com o coração vazio, abraçado em sua dor. Parecia ter um
pequeno fio de crença de que aquilo tudo era somente um sonho, mas infelizmente
tratava-se de um pesadelo que virara realidade.
Uma vida e uma infância foram tomadas naquela madrugada sombria. Foi a última vez
que o garoto, com apenas 8 anos, viu seu pai.

Rômulo Zaragoza

3 comentários:

  1. Texto muito bem construído. Escrita bastante aplicada.

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  2. Já tinha lido seu texto e gostado muito, não sei porque não comentei antes. Gostei muito da forma como você narrou os acontecimentos.

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