Acordei atrasada. Logo hoje que tenho trabalho pra apresentar.
Além disso, é um daqueles dias de calor do Rio de Janeiro que você já
sai do banho suando. Queria botar o meu short preferido e uma blusa
curta. Mas não vou. Tenho que encontrar o meu pai depois da aula e ele
não deixa eu ir de short pra faculdade. De barriga de fora então, nem
pensar. Saio de casa. Na primeira esquina, um homem, dentro de um carro,
passa gritando e buzinando pra mim. Todos na rua me olham. Queria
mandar ele ir para um certo lugar e mostrar um certo dedo. Mas não vou.
Abaixo a cabeça e finjo que não é comigo. Entro no ônibus. Queria sentar
na última fileira e cochilar com a cabeça encostada na janela. Mas não
vou. Prefiro sentar do lado de uma senhora na primeira fileira. Salto do
ônibus. Vejo que tem uma obra mais pra frente, na mesma calçada. Queria
andar naquela calçada pra chegar mais rápido na faculdade. Mas não vou.
Atravesso a rua para evitar qualquer constrangimento. Chego na
faculdade. Ainda não são nem 8 da manhã. O que eu vou ter que encarar
pelo resto do dia? E pelo resto da vida? Queria andar de transporte
público de saia. Queria voltar da festa de madrugada sozinha no táxi.
Queria falar que gosto de futebol e não ter que explicar o que é
impedimento. Queria sair da praia e andar de biquíni pela orla. Queria
viver sem medo, sem restrições, sem estereótipos, sem preconceito. Mas
não vou. Espero que as minhas filhas consigam, talvez eu nem tenha
filhos. “Mas como assim não vai ser mãe?” É difícil. É rotina. Rotina de
mulher.
@justeffy
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