sexta-feira, 20 de outubro de 2017

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 As vezes sinto que estou desperdiçando a vida. Todos os dias levanto, trato de lidar com a rotina em casa e vou para rua. A rotina da rua também não me acalma. Um dia me falaram que estamos o tempo todo em movimento e o que fica parado na verdade fica pra trás. Não sei o que é pior. Todo dia pessoas diferentes estão muito ocupadas correndo com os afazeres de suas vidas praticamente iguais. São pessoas praticamente iguais, trabalhando em apinhados de concreto, ares-condicionados e arquitetura pretensiosa, praticamente iguais. Mesmo se movendo elas também não estão indo para lugar nenhum. O dia passa e a rotina esmaga. 
 No final da tarde, as aulas acabam, todos estão cansados da mesma forma. Todos querem abrir uma fresta na cortina do cotidiano, fazer parecer que o dia valeu a pena. O convite pro barzinho e a solidão segue acompanhada. As pessoas conversam entre si, os assuntos não se aprofundam e mudam com rapidez vertiginosa. Tenho a impressão que ninguém tá prestando atenção de verdade. Sigo calada.
 A noite se aprofunda, porém só nas horas. O convite pro bar vira um convite pra casa. Por que não? Todos aparentemente também seguiram o mesmo script. Pessoas praticamente iguais. O cenário muda, a casa é mais quente mas igualmente vazia. A noite passa, o sexo passa. A vida passa. No outro dia trato de lidar com a rotina em uma casa diferente e vou para a rua. 
 Dessa vez as pessoas andam mais devagar, estão quase todas acompanhadas, é sábado. O dia livre também se parece bastante com todos os outros dias livres, os mesmos passeios, as mesmas formas de diversão. Todos querem fazer parecer que o dia livre valeu a pena. Chego em casa e não tem ninguém. Tento fazer alguma coisa que eu goste mas não lembro quais são a muito tempo. Na verdade eu sei que estou apenas procrastinando os afazeres da faculdade mas eu também quero tentar fazer o dia livre contar. Ligo pra ele. Fazemos - na verdade ele faz - o almoço, comemos, conversamos alguma coisa sobre o que falo nessa crônica. O dia passa, o sexo passa. Durmo porque estou cansada, cansada a tanto tempo que nem sei. Em algum momento penso que tenho que ir embora mas lembro que estou na minha casa. Suspiro, acho que não vou ligar pra ele amanhã e já não quero nem imaginar o fardo do domingo chegando. Sinto que estou desperdiçando a vida.
 
Perséfone Reis

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