domingo, 9 de outubro de 2016


Acabou de acabar

Sentia-me bem falando pra ela que meu trabalho era a coisa mais insuportável do mundo. E sabia que o gelo que sondava nossos vínculos era o que me abastecia. Eu esperava ela chegar do curso e ela não me esperava. Nunca. Foi quando um e-mail ou algo do tipo me mandou sair e tomar uma posição e decidir por mim e fim.
Acabava.
Estranhamente acabamos com o que não começamos e desistimos antes mesmo de saber o que era. Não somos, nem fomos. Pensávamos em ser, talvez. Era claro que eu estava muito bem e ela também e ninguém estava ótimo. Porque não começamos a tentar ser. Era simplesmente uma forma de sentir falta de algo não existente, de uma dor insegura, de uma infantilidade chula.
Refutava.
Nos domingos não era mais que conversa, nas festas éramos fumaça. Lembro-me de ser o cigarro que passava pra ela a nuvem branca e me perdia. Nos perdemos e não estávamos, como não estamos agora. Partidos, éramos bons partidos que se quebraram e a cola ninguém vê. Ninguém viu, até agora. Sinto falta das conversas em que não mostrávamos sentimentos até perder os sentidos e dizer eu te amo.
Niilistas.
Num domingo tentei evoluir, ela sumiu. Não era mais ela e eu queria deixar de ser o mesmo. Peguei umas trouxas com uns trocados e deixei a água fria do mar me chamar de longe.
Partido.
Sinto-me vazio agora. O preenchimento poderia vir dela, ou dele. Deles. Apartado, sei que saudade é espaço aberto num campo. E nesse campo vazio é possível sentir aroma de flor sem ela crescer por aqui. Nos sábados não mais a encontro, e nossos silêncios agora são os meus. Talvez ela precisasse ser o fim que eu precisava para o começar a ser, ou deixar de ser. Arte começa com fins, ou começos.
E agora:
Recomeço.

Oliver Fagundes

8 comentários:

  1. As palavras isoladas foram uma boa estratégia, pois deram ritmo a leitura do texto

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  2. não sei dizer muito bem porquê, mas gostei mt desse texto. e ficou visualmente lindo/mt legal a estrutura. Além de essas palavras isoladas darem ritmo, como falaram ali em cima

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  3. Precisei ler duas vezes pra entender a mensagem. Mas acho que isso é bom, mostra que é um texto profundo e bem escrito!

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  4. Texto bastante poético. MT bom os recursos visuais utilizados cm verbos no passado (acabava/refutava/partido) e, a utilização de metáforas bem fortes, como o domingo. Assim como o uso de antiteses conferiu ao texto jogos e palavras bem interessante, a ao meu ver, é um texto perene. Parabéns!!!

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  5. Texto muito bem escrito e mais complexo. O que mais gostei foi o uso dos verbos mostrando a relação que os dois possuíam (ou não). Parabéns.

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  6. Amei o jeito da escrita, como você utilizou os verbos no passado. E como foi profundo e tocante, e remete o leitor a lembranças das suas proprias separações. Vc usou uma sepração cliche, e transformou em algo triste e lindo. Parabéns

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  7. Bom ritmo, muito bem escrito, ficou um texto muito bom.

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  8. Me prendeu bem, não foi muito elaborado, foi leve e bom de ler. Bem reflexivo

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