Os Sofrimentos do Jovem William
Parece tão lindo daqui. O eterno fluxo de carros e
pessoas indo de um lado para o outro num movimento de um rio afluído a desaguar
no mar. E que mar. Lado a lado de uma costa com uma divindade a te receber de
braços abertos sem pestanejar. Meu Deus, que mundo! E cá estou eu, após ter
dirigido alguns quilômetros para fazer o que muitas pessoas fazem aqui todos os
anos.
Ah... Perdoe-me! Não queria parecer tão rude, nunca
quis. Sempre fui fiel com meus deveres no colégio e cumprimentava as pessoas
com o máximo de cortesia possível, embora não fossem muito de cerimônias. De
todo modo, meu nome é William, mas pode me chamar de Will. Sim, o título lembra
o clássico de Goethe. E não, não quero através disso prestar uma espécie de
culto à obra ou imitar o herói da história, embora o final dessa não escape
muito da ideia original.
De onde estou já posso sentir o cheiro. Os veículos
começam a parar, não por estranhar uma cena incomum no seu cotidiano, mas por
presenciar aquilo que todos os quais atravessam esse percurso todos os dias
presenciam. O crepúsculo do dia já se iniciava e a fumaça vinda dos
escapamentos inundava meu ser, mesmo que nenhuma poluição externa fosse maior
que minha interna.
Devo lhe confessar, também nunca fui muito de
reclamar. Minha mãe sempre dizia: - Você não é uma árvore plantada à beira de
um riacho prestes a cair e as pessoas têm muito mais o que fazer do que ficar
se preocupando com você sua vida, elas têm sua própria vida – Ela costumava
dizer isso, até não dizer mais, até não poder falar mais nada nunca mais. E meu
pai nunca foi muito de falar comigo, ele é do tipo de ir embora pra não voltar
de novo.
No momento em que me encontro já posso perceber os
olhares nas portas dos carros que passam lentamente para formar o
congestionamento de toda semana, o fluxo se interromperia em menos de uma hora
talvez. Já posso ouvir algumas buzinas. São insatisfações de pessoas incapazes
de parar e apreciar a vista que as cerca, não por não saberem apreciar, mas
simplesmente porque não podem, o mundo não as deixa.
Esqueci-me de te contar. Essa é a minha vista
favorita no mundo todinho. Os poucos momentos de calmaria que tive com certeza
se deram nesse mesmo lugar, seja de um lado ou de outro. Seja dentro um ônibus
atravessando a ponte, despedindo-se de Niterói enquanto contemplo a abertura
para o Atlântico até chegar no porto do Rio. Seja numa orla de Gragoatá,
sentindo a brisa cortante vinda das águas enquanto observo uma construção de um
tempo sombrio de nossa história.
Enfim, já era hora. Pensei em me jogar para trás,
mas não queria morrer na contramão e nem mesmo atrapalhar o tráfego. Eu amava
demais aquela vista, por isso me joguei para frente querendo apreciá-la com
todo meu ser em cada segundo. E lá se foram dez metros em alguns
segundos: iriam me criticar por escolher o caminho mais covarde, mas é preciso
muito coragem para pular. Depois se foram mais alguns segundos em vinte metros:
iriam lamentar algo tão trágico, mas nunca impediriam outra pessoa de tentar
novamente. Mais trinta metros e eu nem percebia mais quantos segundos: e
naquela hora eu já havia me arrependido, nunca poderia vivenciar momentos como
aquele novamente. Segundo final: morri apreciando aquela vista como se fosse a
última.
Don Draper
tenho que admitir: que texto incrível cara! MUITO BOM! completamente criativo.
ResponderExcluirsó me atentaria a formatação, não sei se foi sua intenção ou mudou quando foi postado. o texto assim não é muito convidativo para ser lido.
Amei a referência à "Construção" do Chico no último parágrafo, e coincidentemente enalteço a construção do texto, que me prendeu desde as primeiras palavras. Texto muito bem escrito como sempre.
ResponderExcluirQue texto INCRÍVEL! Assim como o Adam Sandler, amei a referência à "Construção", que nos ajuda a perceber toda a angústia do personagem. Parabéns, Don Draper!
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