terça-feira, 22 de maio de 2018

O inevitável

Sempre que a vida nos surpreende é um momento de mudança e de confronto com nós mesmos. Notamos que algo precisa mudar, que talvez a felicidade seja um pouco mais difícil de alcançar do que nós achávamos que seria, e que precisamos amadurecer. Algumas vezes, acontece antes do esperado.

No livro "O Próximo da Fila", escrito por Henrique Rodrigues, isso pode ser encontrado. Com muita clareza e fácil compreensão, a linguagem é simples, levando o leitor a ter uma leitura mais fluida e um maior interesse pela história. O narrador onisciente, que é o protagonista, - cujo nome não é revelado -, começa contando sua história na atualidade, quando já é adulto, voltando no passado para desenvolve-la linearmente, possuindo também momentos em terceira pessoa. Com a perda de seu pai, o adolescente se vê pressionado a começar a trabalhar porque sua mãe não conseguiria lidar sozinha com todas as responsabilidades. Sendo assim, ele arruma um emprego em uma rede de fast food para ajudar sua família, tendo que lidar com a escola e trabalho ao mesmo tempo. Isso mostra uma virada em sua vida, pois antes tinha o privilégio de estudar em um colégio particular e não precisava sustentar os que moravam com ele. 

Trabalhando na empresa, o personagem é obrigado a seguir o "Padrão" internacional, se submetendo a muitas coisas com as quais não concorda e vendo o quão substituíveis as pessoas são para o capitalismo. Quando sofre o acidente, com a queima de suas mãos na chapa, ele se sente aflito, pois não sabe se poderá continuar no emprego. É como se aquele momento representasse sua perda de identidade, não só perdendo suas digitais, mas também toda sua subjetividade, se tornando apenas mais um, como seus patrões desejavam. 

Sem a utilização de nomes, o autor descreve de uma forma especial todos os personagens, que muitas vezes, passam despercebidos, mas que com a leitura do livro, vemos que eles possuem suas complexidades e diferenças, tanto dentro de sua família, quanto no lugar onde trabalha, que são basicamente os lugares onde a história é contada.  Um dos exemplos mais incríveis de que os nomes não são realmente necessários, é quando ele conhece "a garota", utilizando descrições detalhadas e o artigo "a", não "uma", mostrando que para ele, ela é única. Essa foi capaz de mudar completamente o rumo da história, tornando-a diferente de qualquer livro já lido antes.

Com um desfecho trágico: descoberta de que o seu pai tinha outra família, e que coincidentemente, também era o pai da sua namorada, suicídio da garota por quem ele era apaixonado, causado pela gravidez, cujo pai da criança era ele mesmo, sendo irmão dela, o livro mostra, com uma certa confusão, que nem sempre o que esperamos se realiza, que perdas acontecem e são inevitáveis, mas em todas as vezes que somos surpreendidos com coisas ruins, precisamos seguir, por mais que pareça impossível.

Escrevo essa resenha/crônica em frente ao McDonald's, empresa que o autor deixa bem claro ter sido a que trabalhou. Me encontro do lado de fora do balcão. Quais serão as histórias que estes atendentes têm a contar? O que será que eles passam em seus dias de trabalho? Olho para eles e me pergunto: a identidade deles também tem sido perdida? Deixo claro aqui que minha vida de cliente desses fast foods não será mais a mesma.

Por Lady Richie

2 comentários:

  1. Não tinha percebido a parte do artigo no livro, boa observação! Sua resenha ficou 10/10

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  2. adorei!! o final ficou bem criativo!

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