Nunca soube ao certo que critérios classificam uma ação como preconceituosa. Na minha ingenuidade, eu acreditava que o preconceito fosse expresso apenas através de ofensas, comentários maliciosos e olhares mal-encarados, mas de uns tempos para cá estive observando – observando as nossas atitudes enquanto sociedade e indivíduos em meio ao nosso corrido dia-a-dia.
Por exemplo, uma amiga minha, enquanto me contava uma história sobre seu professor de Matemática, sentiu a desnecessária necessidade de apontar o fato de ele ser gay. Minha mente gelou em incompreensão – por que me falar a orientação sexual dele? (Não, aquela informação não adicionou nada à história que me estava sendo dita.) Só algumas horas depois eu chegaria à conclusão de que, naquele instante, eu havia achado aquele comentário preconceituoso. Entretanto, minha amiga não o insultara – ela só chamara seu professor de gay, então por que isso me incomodou tanto? Chamar alguém de gay é ofensa? A palavra gay não é um insulto; nem sequer palavrão é. Né?
Outra vez, surpreendi-me ao descobrir que o mais novo single da minha banda favorita havia sido censurado num programa de televisão por apresentar conteúdo racista. Como qualquer fã, varri a Internet em busca da letra (supostamente) racista e, ao encontrá-la, confusão tomou-me por completo: onde estavam os versos ofensivos à la KKK? O máximo que eu achara foi uma breve menção a negros ("negros te liderarão feito Barack Obama") – a isso que se referia o tal "conteúdo racista"? Levando em consideração o contexto, não havia nada chocante ou ultrajante naquele verso – o compositor o escrevera apenas para dar harmonia ao rap, grande coisa. Então por que chamar um negro de negro poderia ser considerada uma atitude racista? Afinal, um negro não é negro?
Com isso lembro-me dos comentários aleatórios feitos pela minha mãe na minha infância (e que, notei apenas durante minha contemplativa adolescência, na verdade são valiosos ensinamentos de vida). Aos olhos dela, qualquer palavra, por mais inofensiva que seja, proferida com a intenção de insulto é mais ácida do que o mais cabeludo dos palavrões. Sim, chamar um negro de negro ou um gay de gay pode ser extremamente ofensivo – o veneno não está presente na palavra em si, e sim na fala descuidada. Nas ações alienadas. Na mentalidade ignorante
Preconceito é mais do que xingar – é tomar como verdade para si todos aqueles estúpidos estereótipos baseados em cor de pele, em nacionalidade, em gênero, em sexualidade. Todo negro é bandido. Toda brasileira é fácil. Toda mulher dirige mal. Todo gay é "feminino". E no Brasil, o país que se vende intencionalmente com o rótulo de ser receptivo a todo tipo de gente, observa-se que (ironicamente) nosso povo não tem vergonha em exteriorizar esses pensamentos equivocados. E é bem simples comprovar isso – diga-me você: quantas vezes presenciou alguém censurar um colega por fazer um comentário homofóbico?
Entretanto, da mesma forma que esses indivíduos alheios não hesitam em expressar seu preconceito, as pessoas conscientes também deveriam se manifestar. A partir do momento em que você se mantém em silêncio, você está corroborando todos esses ideais ignorantes.
Da próxima vez, censure a piada machista do seu "colega". Faça a sua parte.
Cora
Novamente, amei seu texto Cora! É um assunto muito importante e que realmente precisa ser debatido. Enquanto estava lendo o texto, achei que você iria dizer que falar que alguém é gay, no meio da conversa, sem nenhuma necessidade não seria preconceituoso, já que é só uma característica da pessoa. Mas fico feliz que concorde comigo, porque não vejo ninguém mencionando "aleatoriamente" que alguém é hétero. Enfim... Seu texto tem uma forte ponta antropológica e é profundo, perene, exerce o espírito cívico, ultrapassa os limites do cotidiano, potencializa os recursos jornalísticos e rompe com o lead. Parabéns!
ResponderExcluirOlá amiga Cora!
ResponderExcluirSempre venho ler seus textos com uma enorme expectativa que nunca é rompida, pois você é uma excelente escritora. O tema do seu texto é algo muito importante, parabéns pela inciativa. Ao ler, parei para pensar quantas vezes eu mesma adicionei na descrição de alguma pessoa a sua sexualidade (o pior é que só era mencionada caso fosse homossexual). Agradeço a você, Cora por despertar isso em mim. O seu texto, na minha opinião contém todas as pontas, mas em especial o espírito cívico. Parabéns pelo trabalho maravilhoso!!
Beijos perfumados da sua querida Maria Antonieta.