Lá estava eu, nos meus doces catorze anos, começando a desbravar um pouco mais da vida. Sabem como é o início da adolescência. Curiosidade sobre tudo aquilo que antes nunca foi conhecido. No meu caso, havia uma um pouco peculiar. Durante toda a minha vida, tive uma dificuldade imensa com meu pai, que sempre foi muito agressivo com as palavras. Cresci tendo a consciência de ser “imprestável” – como ele gostava de dizer.
A curiosidade que rondava minha vida era a de sentir o amor verdadeiro de um homem, que me amasse e que cuidasse de mim como eu merecia. Então comecei a, desesperadamente, buscar esse amor. Ficava com todos que apareciam, sem critério algum. Se fosse necessário mudar algo em mim para conquistar alguém, eu o faria sem nem pensar.
E foi dessa forma que a maior dor que poderia sentir na vida me atingiu.
Ele era amigo do meu cunhado. Nos conhecemos numa festa. Parecia ter gostado de mim, porque ao longo dos dias puxava vários assuntos, e até que tinha um bom papo. Então, chegou o convite. “Vamos para algum lugar que possamos ficar sozinhos?” – disse ele. Na minha inocência, sugeri um cinema, afinal, é lugar bem romântico, né? Ele aceitou, e lá fomos nós.
Ao chegarmos, uma surpresa. “Por que não vamos para minha casa? É aqui perto.” Eu tinha medo, algo me dizia pra não ir. Pedi que ficássemos ali mesmo e, contrariado, ele aceitou. O filme começou, numa sala quase vazia, e com ele, todo o clima. Beijos, carinhos... “Pera aí, o que ele está fazendo apertando minha mão dessa forma? Meu Deus, ele está tirando minha calça. Por que toda essa agressividade? Está me machucando. Já disse que não quero. Por que ele insiste? Eu não consigo falar nem fazer mais nada. Estou com medo.”
Ele me deitou na cadeira, aproveitou que a fileira estava vazia e eu, em completo choque, não conseguia mais dizer nada. Usou e abusou. Fez de mim o que queria.
Dor. Era a única coisa que podia sentir. Física? Também. Mas emocional. Aquele ser humano (se é que posso chamar assim) tirou de mim o que de melhor eu tinha. Minha alegria, sensibilidade, pureza. E quem dera tivesse acabado ali. Depois disso, ainda me obrigou a fazer oral até que ele atingisse o orgasmo.
Em casa, após todo esse sofrimento, fui desabafar com um amigo. Minha mãe, percebendo que eu estava estranha, tomou o celular da minha mão e leu minha conversa. Acho que a pior parte foi aí.
Broncas e mais broncas. A culpa foi minha. Eu saí com uma pessoa que não conhecia. Eu deixei que ele encostasse em mim. Era bem feito aquilo ter acontecido pra eu aprender.
É. Eu acreditei que a culpa era minha e levei isso por toda a vida. Me coloquei naquela situação e deixei que fosse assim.
Tempos depois, ele foi acusado de estupro. Mas não deve ter sido culpa dele, a pessoa deve ter provocado. Tadinho, levando toda a responsabilidade. Afinal, a culpa não é sempre da vítima?
Baby Shark
Dói. Dói muito ler esse texto e pensar que MUITAS pessoas - incluindo eu - têm a mesma relação complicada com o pai. Dói pensa r nas catástrofes que isso pode gerar. Dói também pensar que infelizmente várias outras pessoas passaram pelo mesmo que você.
ResponderExcluirO final de certa forma me alegra, porque eu percebi que no fundo você sabe que a culpa não foi sua. E se você ainda tem alguma dúvida, A CULPA DEFINITIVAMENTE NÃO FOI SUA!
"Você podia ter negado, gritado, se afastado." Provavelmente você ouviu alguma dessas baboseiras. As pessoas não sabem o que é estar vulnerável, solitária, abalada emocionalmente até passarem por isso. Não sabem o quão suscetível você fica a "aceitar" certas coisas, a pensar que você merece o que aconteceu de ruim, que a culpa foi sua, que você não presta. Quem disse que a culpa é sua, não entende como é sentir isso e não sabe o que tá falando. Novamente, digo: A CULPA NÃO FOI SUA.
Esse monstro disfarçado de humano pode ter tirado coisas de você naquele momento, mas sinceramente de todo o meu coração que você tenha superado isso. Você é, todos nós somos muito mais do que os nossos traumas. Mesmo tendo sido HORRÍVEIS, eles nos deixaram mais forte, e espero que você pense e se sinta assim. Mesmo sem saber quem você é, eu SEI que você é forte e que você merece o mundo todinho <3
Recuperada da emoção do momento, vamos ao trabalho:
Não consegui identificar nenhum erro grave no texto, mas acho que você podia botar aquele espacinho básico na primeira linha dos parágrafos, só por questão estética e de organização mesmo.
Você terminou muito bem, de verdade. Ironia, tapa na cara e reflexão. Parabéns, bebê tubarão <3
Tentando ser crítica, mas com vontade de chorar, te digo que gostei de como você articulou a causa e a consequência num primeiro momento e de como descreveu todo o crime depois. Obrigada pela coragem <3
ResponderExcluir