quarta-feira, 3 de abril de 2019

Bandido bom é bandido conhecido

Estávamos eu e meu pai a caminho do shopping quando minha mãe me liga chocada, dizendo que, mais uma vez, o ex marido da minha prima, um cara privilegiado, com uma família bacana e boa condição financeira, bateu na atual esposa. 
- Se isso foi agora, dá tempo de chamar a polícia, né? Esse corno MARGINAL tem que ficar preso até aprender a ser gente. Puta merda, que raiva - disse, puta dentro das minhas calças
- Não é assim também, né! Alguma coisa ela deve ter feito. Tem que ver o lado dele também, po! 
- Ah, tem que ver o lado dele? Não sabia que macho escroto privilegiado tinha um lado bom...
- Mas o Beto é diferente, a gente sabe que é gente boa - eu não sei de nada, não- ele tem os problemas dele, né, filha? Alguma coisa aquela mulher deve ter feito... Não dá pra julgar, não.  Agora você vê! Chamar a polícia pra um amigo da familia, dizer que é marginal... você não tá é bem! -disse  papai enquanto ligava o rádio.
 Eis que escutamos uma notícia sobre um jovem de 17 anos que havia tentado roubar a carteira de um homem no centro da cidade.
- Tem que matar esses filhos da puta!
Eu, que me estresso com esse tipo de comentário, me segurei.
- É, pai? Mas pra quê isso tudo? É sobre a vida de uma pessoa que a gente tá falando, não tem jeito. Qual é o exemplo que esse cara tem? Que tipo de estrutura familiar, financeira e emocional é real pra ele? Tá errado? Claro que tá, mas não dá pra olhar só pra um lado, né?
- Ah, é? E, por acaso, o ""pobrezinho"" pensou na vida do cara que quase perdeu dinheiro pra ele? Hein? Estrutura familiar... Eu não tive isso e tô aqui, não tô? 
- Ah, e POR ISSO, ele tem que morrer, né? Eu não tô falando que é normal e aceitável que alguém roube pra sobreviver, tô tentando te dizer que não dá pra botar tudo no mesmo saco.
- Não começa com esse teu papo de esquerdista, não, hein. É bandido porque quer. Era só o que faltava, Heloísa, você defendendo trombadinha. Cometeu um crime? Pois vai ter que pagar. Bandido bom é bandido morto! - disse meu pai, estacionando na vaga de idoso no shopping.
Tentando entender que o óbvio não é mais óbvio, Heloísa Dandara

9 comentários:

  1. Gostei da cronica, amo seus recadinhos antes do pseudônimo kkk
    Acho que no primeiro parágrafo tem um pouco de pronome possessivo demais. (Meu pai, minha mae, minha prima) Não ficou nada TÃO exagerado, mas acho que o parágrafo soaria melhor se vc tirasse um deles, botasse "de uma prima" ao invés de usar o pronome possessivo.
    Também acho que seria mais legal vc deixar a dissonância um pouco mais clara,talvez um leitor que nao saiba que esse é o tema não perceba isso como foco (mas só eu ter demorado um pouco pra perceber pq sou trouxa com certeza é uma hipótese valida kkkk)
    Bjs

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    1. Boa! Não me liguei nos pronomes. Pra mim, o objetivo é passar a mensagem sem, necessariamente, explicitar que é sobre dissonância cognitiva, sabe? Mas bons pontos, vou tentar melhorar no próximo!

      Cheia de curiosidade pra saber quem você é, Heloísa Dandara

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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    1. Oi! Muitos palavrões hehe. Não tem problema algum fazer uso dessa linguagem, mas acho que vc poderia articular melhor o emprego deles para não parecer cansativo ou batido. Eles carregam uma carga, é bom agregá-la ao texto.
      Gostei do recadinho no final.
      ps: já leu rubem fonseca? "O seminarista" tem essa linguagem moderna que constrói totalmente o caráter do personagem. "O sol sob a cabeça" também.
      Se der uma olhada, me diga o que achou!
      Ps 2: Aqui é o Toninho Rodrigues, não sei mexer nesse site direito, um dia eu descubro como configurar meu nome [risos]

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    2. Eu adoro o Rubem e "O Seminarista" é um dos meus favoritos! O uso dos palavrões foi proposital, é assim que nós falamos! (Minha mãe já brigou MUITO comigo por causa disso rs)

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Gostei da mensagem e da história! Hipocrisia reinando atualmente, precisa ser exposta. Só tome cuidado com pontuações e repetição de palavras, não que tivesse tantas repetidas ao longo do texto, mas o "puta" na mesma linha incomodou um pouco sonoricamente.

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  5. Seu texto resumiu a atual sociedade hipócrita que existe em nosso país. O tema foi articulado da melhor maneira, e achei a dissonância presente no nível certo. Curti bastante o texto, bom trabalho! Abraços!

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