Já se perdoou hoje?

Ter boa memória é uma coisa que sempre admirei. Lembrar de coisas que ninguém

lembra, saber o ano, o dia e a hora daquele acontecimento totalmente irrelevante, mas

que você pode precisar pra fazer ligação com um outro dia que foi próximo. Reviver

momentos extraordinários várias e várias vezes na própria cabeça, sentir a felicidade e a

inocência da infância pensando naquele pique-esconde numa sexta-feira à noite, se

arrepiar lembrando do toque de quem se ama... É gostoso lembrar das coisas, o

problema é que tem algumas que eu quero esquecer.

O ano era 2015, 2016, 2017, 2018, 2019 e até 2020. Em cada um deles tiveram um ou

mais acontecimentos que minha ótima memória não me permite esquecer, fazendo com

que eu cultive o sentimento que mais me perturba: a culpa. A culpa por ter permitido

que me fizessem ser alguém que eu não sou por longos anos, por confiar em alguém que

sempre mostrou não ter caráter, mas que eu quis dar uma chance afinal, todo mundo

merece uma chance. A culpa de não passar no vestibular junto com a maioria dos

amigos, a de não dar orgulho aos pais, de não ter sido suficiente para uma pessoa, de

magoar o outro, ou até mesmo de ter sido magoada sabendo que podia ter evitado. São

tantas culpas que eu poderia passar dias falando de todas que me atormentam, mas acho

que não me cabe mais ficar alimentando tudo isso.

Enquanto as culpas vagam pelos meus pensamentos, vou começando a me perdoar. Me

perdoar pelos meus erros e por ter deixado que errassem comigo. Isso é o que me cabe

agora. É cedo pra dizer que vou conseguir sair totalmente ilesa desse mar de culpa, mas

depois de tantos anos de autossabotagem e sofrimento, é bom estar - finalmente -

tentando. 

Mas e vocês, já tentaram se perdoar hoje? 

Alice no país das loucuras