Aniz Abraão David, mais conhecido simplesmente como Anísio, se tornou um dos mais temidos contraventores do Rio de Janeiro.
Você sabe de quem estou falando?
Nascido em família de origem libanesa e erradicado em Nilópolis, Anísio ganhou notoriedade como bicheiro na Baixada Fluminense e por ser o patrono da escola de samba Beija-Flor de Nilópolis, além do fato de sua família ter construído um verdadeiro império na região, com influência política e social. Anísio dá as cartas em Nilópolis das mais diversas formas.
Para entender como Anísio chegou lá, é necessário entendermos retornarmos à época da ditadura. Seu primo, Jorge David, servia de delator aos militares. Foi o suficiente para alçar ele e seu irmão Simão Sessim (este na ativa até os dias atuais) à política. Mas também foi útil a Anísio, que pôde ampliar seu esquema de Jogo do Bicho em diversos pontos sem o incômodo dos militares.
Mas não só isso. Anísio ainda recrutou militares atuantes em centros de tortura como seus homens de confiança.* Sabendo sempre com quem estava lidando, se tornou amigo íntimo de vários.
Simultaneamente a esse fato, existia a Beija-Flor. Com o intuito de fortificar ainda mais sua fortaleza, o libanês foi o manda-chuva por trás dos desfiles que transformariam a escola nilopolitana na grande potência do carnaval. Anísio se tornara o homem daquela festa.
Com o fim da ditadura, Anísio não perde força. Pelo contrário. Junto com outros bicheiros ligados à escolas de samba funda a Liga das Escolas de Samba (Liesa), com a premissa de "organizar o carnaval carioca", mas que além de tudo, foi a chave para manter os contraventores unidos.
Em 1989, Joãozinho Trinta, na Beija-Flor, se colocava como um dos grandes carnavalescos da história no enredo "Ratos e Urubus, larguem minha fantasia", recheado críticas sociais, na qual surgiu a famosa imagem do Cristo Mendigo (imagem) - proibido pela justiça a pedido da Igreja Católica. No meio da multidão estavam lá, velhos amigos de Anísio, torturadores da Casa da Morte, em Petrópolis. Fantasiados de garis, certamente numa enorme incoerência pelos seus atos nas décadas anteriores.
Anísio teve vários filhos. Um dos mais notórios é Anderson Muller. Atuou em várias da Globo, como no conhecido papel de Abel, em Caminho das Índias. Seu par com Norminha (Dira Paes) caiu nas graças do povo.
Em meados de 2017, seu filho mais novo, Gabriel David, estudante de Administração, deu a ideia do enredo de sua escola para o carnaval de 2018. Era basicamente uma crítica a Deus e o mundo, denunciando "tudo de ruim que aflige a população brasileira". Tal samba enredo foi replicado por diversas lideranças progressistas no período carnavalesco. A Beija-Flor se consagraria novamente campeã.
Em 1987, Anísio criara um projeto social dentro de sua escola de samba. Um educandário com aulas de ensino fundamental, oficinas de percussão, aulas de passistas, ou seja, tudo aquilo necessário para formar novos componentes da escola. Além disso, cidadãos longe da criminalidade. Mais além ainda, uma forma de perpetuar a influência de sua família na cidade.
E como entender Anísio? Com o passar dos anos, de suas atitudes, é possível traçar um aspecto, de, alguém que não tem ideologia, sequer se interessa por isso. Anísio vai apenas em busca do que é melhor para si e para aumentar seu poder. Dançar conforme a música é evidentemente algo que o bicheiro sempre fez. Desde organizar enredos ufanistas e de exaltação a ditadura (como nos anos de 1973 a 1975), ou autorizar temáticas sociais (1989 e 2018). Desde ser acusado de desaparecimento de inimigos, fazer aliança com militares, a construir escolas, realizar projetos sociais. Se adaptar às épocas, e ainda ser amado.
Por Almirante João Cândido.
*Algumas informações do texto foram retiradas do livro "Os Porões da Contravenção - Jogo do bicho e ditadura militar: a história da aliança que profissionalizou o crime organizado" de Chico Otavio e Aloy Jupiara
Almirante, parabéns! A escrita está impecável.
ResponderExcluirTexto muito bom! Achei super interessante sua escolha de personagem!
ResponderExcluirEstou apaixonada pelos seus textos, Almirante! Sempre recheados de conteúdos interessantes! Parabéns!
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