quinta-feira, 22 de março de 2018

O(mentir)

Fulano não sabia mais quem era. Após um longo dia no escritório passando horas e mais horas registrando números que não vão curar o câncer e nem salvar a Amazônia, se sentiu vazio. Vazio porque poucos minutos antes havia participado de uma reunião em que ficara sabendo que foi promovido. A vaga que iria ocupar porém era de um conhecido que trabalhava na empresa em função de pagar as despesas do hospital do pai, que tinha uma doença grave e que agora sem poder bancar todos os exames provavelmente iria morrer em pouco tempo. Mesmo que isso tenha passado pela sua cabeça, no momento em que foi informado da promoção, Fulano abriu um sorriso. Sua empatia havia desaparecido. Alguns reais a mais em sua conta bancária haviam se tornado mais importantes pra ele que uma vida. Resolveu então convidar alguns amigos para comemorar e todos agiam como se estivesse tudo ótimo, exibindo o mesmo sorriso amarelo de Fulano como semblante sendo que, entre eles: 1)havia sido demitido semanas antes mas comentava sobre seu emprego como se ainda o tivesse. 2)estava dormindo no sofá dos pais após ter se separado de sua mulher, que não o amava mais. Ambos não falavam nada sobre o assunto por vergonha. De não terem uma vida perfeita, de não terem o que comemorar, vergonha de serem eles mesmos. Nem mesmo com Fulano, que era seu melhor amigo, eles tinham coragem de desabafar porque Fulano parecia estar sempre bem, e é muita pressão expor seus problemas pra uma pessoa tão feliz assim. Mal sabiam que Fulano se sentia perdido, preocupado em não ser uma boa pessoa como acreditava ser, em ter se tornado mais um egocêntrico. Ele também mentia, ou pior, omitia. As relações se tornaram tão líquidas quantos os 70% de água do corpo humano(se é que ainda havia humanidade naquele corpo já que humanidade é definida como conjunto de características específicas à natureza humana e, enquanto omitidas, elas aos poucos se esvaem). Todos eram então fulanos. Todos somos fulanos.

Por São Valentin.

6 comentários:

  1. Que texto reflexivo! achei de ótimo gosto e realmente na maioria das vezes somos "fulanos"

    ResponderExcluir
  2. Infelizmente, realmente pensamos muito mais como "fulanos"...
    Ótima temática e exposição, apenas achei que a pontuação faltou em algumas partes.

    Mary-L. P.

    ResponderExcluir
  3. Falta empatia, falta humanidade, falta sinceridade...

    Gostei muito da abordagem do tema. Super reflexivo! Senti apenas certa desorganização por conta da falta de parágrafos e de algumas vírgulas, mas pode ser só uma preferência pessoal mesmo. Fora isso, gostei muito texto!

    ResponderExcluir
  4. SIM, nossa SIM pra tudo! Tirando a estruturação, tudo estava bom. A utilização da teoria da modernidade líquida de Bauman com um fato biológico foi extremamente inteligente e interessante. Senti influências de Morte e Vida Severina em sua crônica (o final para ser específico) e adorei Parabéns!

    ResponderExcluir
  5. achei a crônica "desorganizada". Não no quesito das ideias, mas na parte gramatical. Fora isso, meus parabéns! eu gostei muito da reflexão.

    ResponderExcluir