segunda-feira, 19 de junho de 2017

O assassino senta ao lado

O medo da morte, de certo, transforma quem nós somos, quem seremos ou deixaríamos de ser. Viver com medo de morrer por via das dúvidas talvez seja a própria morte empiricamente sendo consumada nos passos que deixaríamos de dar ao sairmos dos nossos quartos todas as manhãs, ao não emitirmos a sonoridade da voz ao nos calar, abafar nossas risadas, engolir o próprio choro, nos aprisionar, não nos relacionar e apostatar do que acreditamos que pudesse dar sentido à vida.

Lembro-me das noites de temor vendo o dia clarear, do frio, do percurso que caminhei durante dias sem ouvir a buzina dos carros, dos passos, som das conversas, o canto dos pássaros.

A minha própria voz já não ouvia, meus pés já conheciam aquele mesmo caminho que me levava mecanicamente ao meu destino todas as noites, afinal o rumo da vida continuaria.
“O que eu estava fazendo ali? ” A única pergunta que eu fazia a mim todos os dias.

Quanto a minha vida valeria.
Sentia-me frívola, fraca, atemorizada.
Resolvi andar com um spray de ácido muriático, me senti potencialmente protegida da morte ao menos até o portão de casa, a segurança não durou mais que dois minutos. Estava ali novamente amedrontada.

A que poder me atribui para danar um outro ser com ácido mesmo que por autodefesa? Logo pensei, “Serei um monstro”.
Desabei.
Me calei dando espaço aquela voz masculina sussurrar ao meu ouvido:
“Eu sou frio”
Voz que martelava em minha mente, rasgava meus ouvidos feito lâmina todos os dias, a mesma do criado ao lado da cama, presumivelmente para me trucidar naquele dia.

A liberdade daquele opressor me encarcerou, e faz germinar em mim o decesso das minhas ambições naturais. Já não sabia se viveria, se teria mais alguns dias ou se aquele pesadelo acabaria.


Isabel Cristina 

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