sábado, 3 de junho de 2017

Tranquilamente ambicioso

Eu estava na Universidade Franco Figueiredo (UFF) dando uma palestra sobre meu projeto atual para alunos de Ciências Políticas, quando um deles me perguntou: "Qual a sua maior ambição?" Olhei para frente num olhar espontaneamente reflexivo, e me permiti pensar por alguns segundos, mesmo que essa pergunta tenha sido respondida há tantos anos, quando peguei uma câmera pela primeira vez. Enquanto eu estava sentado, ouvindo ainda meu amigo que me convidou a dar a palestra, vi aqueles garotos e garotas entrando na sala de aula tão falantes e efusivos, e me lembrei da época em que estudei biologia. Era apaixonada por tudo aquilo, e tão efusiva quanto aqueles jovens hoje são. Não digo que a minha juventude se foi, porque o esporte não me deixa viver longe do que muitos chamam de aventuras. Mas meu cabelo está começando a ficar grisalho, e agora, aos quarenta e tantos anos, as coisas parecem mais naturais e fluidas pra mim. 

Desde criança vi meu pai reivindicar seus direitos e de seus companheiros de trabalho. Sempre vi em minha família a busca cansativa, porém necessária, por justiça social e reformas que façam crescer, e não diminuir os rendimentos dos trabalhadores. Aprendi com eles a agir assim, a pensar nos outros como penso em mim. Minha família é sempre a primeira a levar o crédito por quem sou, e pelas ideias que construí. E essas ideias me trouxeram ao ponto em que estou.

Hoje eu sou fotojornalista. Penso que estamos vivendo um momento político tão importante quanto os períodos dos presidentes Jango, Getúlio Vargas, e da ditadura militar. Imagino que as crianças do futuro estudarão nas escolas esta fase que vem desde as manifestações de 2013, e irá até sabe Deus quando. Por isso, me propus a registrar esses momentos, desde a queda da ex presidenta, "até sabe Deus quando". Minha intenção é que as pessoas vejam o que realmente acontece. Não nego que tento influenciar sob o meu ponto de vista. Mas é que, para mim, é impossível conceber a realidade sem o olhar.

Por exemplo, para ir à UFF eu vesti uma camisa de mangas compridas e cor laranja, com um jeans largo. A cor da minha blusa pode dizer que eu sou alegre e alto astral, e que gosto de dar gargalhadas, muito mais do que sorrisos curtos e falsificados. Ou pode simplesmente dizer que a escolha da minha roupa se deve ao fato de que peguei as primeiras peças que vi no armário. Porém, quando vejo uma presidenta de esquerda vestindo vermelho em seu discurso de despedida, ao lado de seus apoiadores, muitos dos quais também vestem vermelho, imagino que sua mensagem está muito além do seu humor ou disposição. Minha leitura da realidade, neste caso, é que existe (ou existiu) uma cor brasileira que tenta falar mais alto que o verde e amarelo. Então, fotografei. Fotografei para que vejam o que eu vi. E para que vejam o que quiserem ver. Tenho a intenção de influenciar, mas não de manipular. Isso, infelizmente, já tem quem faça muito bem. 

Muitos acreditam que abandonei a biologia por causa da política. Na verdade, não considero isso uma opção. Não sinto falta do tempo em que trabalhei como biólogo, mas o que faço agora não está desconectado do meu trabalho anterior, porque o meio ambiente é uma questão política. O que aconteceu comigo foi como o encontro das águas. Fotografia, política e biologia se encontraram, e desaguaram perfeitamente na minha vida. Respondi à pergunta de um dos alunos, no tom de voz baixo e tranquilo que me é habitual: minha maior ambição é continuar fotografando. Pode parecer conformismo para uma geração que está sempre em busca de mais, mas é assim mesmo quando a gente se realiza, quando a gente ama de verdade o que faz. E eu quero muito que aqueles alunos sintam, um dia, o mesmo prazer que sinto ao estar atrás de uma câmera, vendo e mostrando o que estou vendo. 

Carolina Caracol

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