Sou o símbolo da ruína de uma ideologia considerada caída pelos homens ocidentais. Sem os grilhões tecnológicos que impediam uma catástrofe, superaqueci e explodi. Um inimigo invisível, aniquilei dezenas de vidas e decretei a morte de vilas e habitações, hoje, enterrados ao meu redor sob toneladas de areia. Fui a origem de artigos científicos, assim como de filmes de terror e histórias românticas; nas quais executei uma canção mórbida sob as quais soldados e bombeiros contaminados tiraram seus pares para dançar e flertaram com a morte em nome do amor. Minha nuvem de plutônio, césio e estrôncio enevoou incontáveis histórias de vida, de resistência, mas não as apagou. Fui mais que um apocalipse soviético, fui palco onde escondi sob minhas cortinas pessoas, vivências, vozes. Concedi à natureza o espaço que, seu por direito, o homem havia tomado. Fui renascimento, vegetação que venceu o concreto e floresceu, animais selvagens que encontraram lar. Porém, ainda mortal. Musgos que se tornaram pequenas bombas atômicas, florestas avermelhadas e agora talvez perenes, arte letal esculpida por mim. Para os samosely que me desafiaram, não passo de lar; temem mais a fome e a solidão do que a mim. O que significo depende do ponto de vista de quem observa, mas ainda sou o que sou. Meus tentáculos não têm cheiro, cor, som ou aparência, mas deixam marcas, ceifam. Fui passado, mas me perpetuarei a cada geração contaminada por doses de radiação. Prazer, eu me chamo Chernobyl.
Lukas Salazar
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