“Nem de humanas e nem de exatas. Você é de preguiças, garota.” Aquela frase
martelou na minha cabeça por, pelo menos, 3 dias. Em resposta, não articulei muito -
me vi sem saída, presa em uma risada tímida e sem jeito. De primeira, concordei.
Entendi que o melhor a se fazer era assumir a preguiça como o meu único super-poder.
Já bastava ser inútil; hipócrita seria demais.
Eu tinha 11 anos. Era elogiada por todos os professores e firmava as notas do
boletim sempre acima de 8. Nunca foi cobrança, tampouco ambição; sempre foi medo.
Medo de estar fadada ao fracasso, de não ser suficiente ou de chegar perto, mas nunca
no “até que enfim”. Pelo olhar inseguro de uma menina, o mundo incerto parecia deixar
de ser tão incerto se algumas demandas fossem atendidas. Até aquele momento.
As palavras saíram como se estivessem engasgadas na garganta. Com força.
Com raiva. Senti um ódio que nunca haviam me dirigido antes. Sem piedade. Sem
porquês. Fiquei anestesiada. De onde veio tanta aversão? Será que a minha falta de
habilidade com números irrita? Será que alguém descobriu o livro que roubei da
biblioteca? Ou será que contaram do meu caderno incompleto? Não sei. Só sei que
consenti. Consenti, concedi, permiti, aprovei, apoiei e aceitei. Tudo isso em um único
sorriso desengonçado.
Lembra do mundo incerto? Pois é. Ele era mesmo cheio de incertezas. Dali em
diante, qualquer dúvida genuína de tabuada se transformaria em um show de
humilhações. Em cartaz “A burra preguiçosa”. Estreando uma ex-aluna exemplar, que
agora teria de enfrentar o temido monstro “Matemática”. Do que adiantavam os
gabaritos em Português se as equações ainda estavam sem solução?
Alguns anos e umas recuperações de tortura. Provas corrigidas em um vermelho
gritante na minha frente. Dizia em alto e bom tom todas as minhas notas na entrega de
trabalhos. Ouvi tantas vezes que mal conseguiria contar: “limitada”. Engoli seco a cada
fim de aula que me olhava fixamente pra perguntar se alguém não havia entendido. O
circo da vergonha perdurou tanto que a turma até previa quem seria a escolhida pra
fazer as contas no quadro.
A máscara caiu. Eu não era mesmo tão boa. Internalizei que essa coisa de ser
brilhante não era pra mim. O sucesso não dava espaço para medianos. Fui me afastando
dos meus interesses e sonhos. Tomei um lugar no fundão e ali fiquei. De onde nunca
deveria ter saído. Ela conseguiu. Me derrotou junto dos talentos secretos que guardava
comigo.
O tempo fez papel de curandeiro. Cresci e me redescobri. Encontrei um espaço;
uma tribo; uma verdade. Retornei ao meu lugar de origem, perdida nos livros e afogada
nos textos. Hoje, minha Bic Cristal reconhece que rabiscar crônicas pode ser muito mais
extraordinário que anotar fórmulas.
Bic Cristal.
Bic, sensacional! De verdade! Mais do que ser de exatas, ou de humanas, prefiro ser de crônicas também. E o seguinte: a gente sempre acha que não é bom o suficiente, mas será que é verdade? Eu acho que sua caneta tem poderes especiais(e não é de super-preguiça). Espero o próximo texto!!
ResponderExcluirMuito obrigada, Asa! Fico honrada em saber que gostou. A gente segura na caneta e tenta, né? Hahaha.
ExcluirBic, suas crônicas sempre são demais! Me identifiquei em algumas partes, já me senti igual a você, quando o assunto era exatas. Que bom que você se encontrou com a caneta bic cristal!
ResponderExcluirMaravilhoso! Mesmo que não pareça, acho que muitos jovens passam pelos mesmos problemas. Que bom que você conseguiu superar essas inseguranças e encontrou seu lugar!!
ResponderExcluirAchei muito bom! Me identifiquei...o tempo vem me curando, espero receber alta logo. É muito bom poder ser nós mesmo e fazermos o que gostamos...a vida fica gostosa, né?
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