quinta-feira, 17 de junho de 2021

Não é hora de ir

Era uma madrugada tranquila até o celular tocar. Até hoje não há palavras no mundo para descrever o desastre absoluto que foi instalado na minha vida naquele momento. Ela queria ir. Ir mesmo. Ir e não voltar. Nunca mais. Para ninguém. Para lugar nenhum. Só que não era hora de ir. Como deixar claro que o mundo não faria mais sentido se ela embarcasse numa viagem sem volta nem destino? Meu único desejo era entrar na cabeça dela e organizar o caos, como se eu fosse o único foco de luz no meio de tanta escuridão. Não é hora de ir. O que eu fiz de errado? 


Talvez eu não tenha falado uma frase impactante o suficiente para convencê-la a ficar. De repente, faltou amor ou compreensão. Não importava mais naquele momento. Ela queria ir. Eu não podia deixar. Encarando aquela tela se passaram incontáveis pensamentos pela minha mente. Feridas de anos tiveram que ser abertas e saradas em horas, por mensagens de texto. A cada palavra que eu digitei, senti que não consegui achar as outras milhares que precisavam ser ditas. O sentimento de incapacidade só crescia. No entanto, as palavras que para mim eram confusas soaram muito claras. Eu a convenci. Não é hora de ir. Ela entendeu. Ela acreditou na minha promessa de dias melhores e noites menos solitárias. Mas, por mais que eu tentasse me convencer de que o pior já tinha passado, continuei em choque. A culpa de não ter percebido que ela não queria estar aqui, enquanto eu existia perfeitamente bem. 


Mesmo agora, os dias sendo melhores e tendo companhia nas noites, eu ainda me vejo naquela madrugada. Me pergunto se vou acordar e alguém terá ido, sem eu perceber, sem eu ter  a chance de ajudar. Por muito tempo esse medo esteve bem escondido de mim e dos outros. Mas, ele começou a transbordar. Algumas mensagens viraram taquicardas e mãos frias. Conversas simples se tornaram motivo para pânico. O medo constante me fez ver em mim a vontade de querer aliviar sofrimentos dos quais não faço parte. Ainda que a angústia ocupe meus pensamentos, entendo que o melhor que posso fazer é continuar perfeitamente bem. Estar sempre presente é poder ser acompanhar e mostrar uma nova direção para quem se sente perdido no próprio caminho. Só assim é possível deixar claro: Não é hora de ir.


Tela Azul 

14 comentários:

  1. Cara Tela Azul, amei mergulhar no mar de sentimentos do seu texto, acredito que você não merece esse sentimento de culpa, você faz o que pode, pois nesse mundo nós já carregamos nossos próprios fardos, tente pensar um pouco em você também, acho lindo essa sua capacidade de colocar os outros em primeiro lugar, mas não abuse disso, você é a única que pode cuidar desse universo chamado você. Te desejo sorte na caminhada!

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  3. Tela Azul, seu texto me prendeu de uma maneira diferente. Já na primeira frase fiquei ''hum, deixa ler isso aqui''. E permaneci presa a leitura durante todo o texto.
    Ah! e as pessoas e as coisas e as situações vão, estão e acontecem e a gente não tem realmente como controlar isto. Dispa-se da culpa, viu?

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  4. "Estar sempre presente é poder ser acompanhar e mostrar uma nova direção para quem se sente perdido no próprio caminho. Só assim é possível deixar claro: Não é hora de ir." Tela, esse final me baqueou. Quanta sensibilidade, verdade e intimidade. A escolha das palavras, a construção do texto, a história e a reflexão que propôs, ainda que indiretamente, me impressionaram como poucas leituras. Lindo texto. Mil vezes parabéns.

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  5. Oi, Tela Azul. Seu texto me deixou muito triste, ficou muito bem escrito. Você não fez nada de errado! Não esqueça isso.

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  6. Tela Azul, o sentimentalismo no seu texto é paupável! Nesse mundo, coisas ruins acontecem todos os dias e não devemos nos culpar por elas. Acho incrível a forma como vc se entrega as pessoas que vc gosta mas lembre-se que isso não pode ser exagerado, vc tbm precisa se dedicar a vc mesmo! Boa sorte na sua caminhada!

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  7. O seu texto é simplesmente lindo, o jeito que você narra nos envolve de um jeito incrível e a reflexão no final é realmente maravilhosa, Parabéns pelo seu texto e pela sua força.

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  8. Achei seu texto lindo, seus detalhes e sentimentos. Infelizmente não podemos controlar partidas, acho que só podemos aprender a lidar com ela, amadurecer. Saiba que amei como consegue passar sentimentos nas suas palavras, ansios@ pra ler mais textos seus!

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  9. Me emocionei muito com seu texto, Tela azul! É realmente muito difícil lidar com as coisas que não temos controle sobre. Lindo texto, parabéns!

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  10. Tela Azul, seu texto me causou muito desconforto (não é uma crítica, pelo contrário). Você descreveu muito bem a sensação que é tentar convencer alguém que não vê motivos pra ficar a continuar remando e o trauma que vem depois. Faltam palavras, mas não falta o medo de falar algo errado. Será que eu poderia ter feito mais? Será que você poderia? Será que alguém no mundo poderia? Se soubesse quem você é, te daria um abraço, te agradeceria mas diria pra você não se colocar a responsabilidade de estar sempre presente. Carregar o peso do mundo nas costas não faz bem pra sua saúde.

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  11. Parabéns pelo texto, Tela Azul! Amar, significa deixar partir e dizer adeus também se faz necessário.

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  12. Que texto espetacular, Tela Azul! A forma que mostrou seus sentimentos em cada linha me envolveu e comoveu do início ao fim, e que fim perfeito. Parabéns!

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  13. Esse sentimento é muito familiar, as mãos suando, a ansiedade e o medo de perder alguém importante. Apesar dela não ter ido, você sente que a qualquer momento ela pode mudar de ideia, e seu mundo desabaria em poucos minutos. Seu texto é muito tocante, Tela Azul!

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  14. Confesso que só consegui compreender exatamente o que aconteceu quando li o terceiro parágrafo, até então eu tinha apenas algumas hipóteses, mas quando entendi achei o relato bem forte e íntimo, até então nunca tinha lido algo sob essa perspectiva.

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