quinta-feira, 17 de junho de 2021

Encontros com o Sol

Eu me encontrei no Sol. Devo dizer que depois de tanto tempo perdido, estar entre as

cordas remendadas de um som salvador, me faz feliz. Não digo magnífico, esplêndido,

fabuloso. Mas mudou minha vida com algo que eu rejeitava, e na procura por qualquer

sinal luminoso, encontrei minha própria paz.


Para um garotinho no auge dos seus 10 anos em 2013, onde tudo que se procura é

uma coca gelada e qualquer brincadeira descontrolada, a solidão podia ser uma praga.

Os colegas de escola vidrados no incrível Ipad que rodava todo tipo de jogo, desde

Subway Surfers (o joguinho do grafiteiro pego por um policial que foge correndo em

cima de metrôs), até Angry Birds. Pois bem, aquele garotinho não entendia nada do

que rolava entre os garotos do colégio, e por mais que ele tentasse compreender esse

estranho novo mundo, era um outro tipo de universo, o que podia lhe render clássicos

apelidos, dos mais pesados aos mais caricatos. O garotinho não curtia muito comentar

sobre os eventos que o marcavam na escola. Havia companhia para o desabafo, mas

ele sentia que algo o prendia dentro de uma cela aberta, onde o silêncio o impedia de

lutar por si mesmo. O silêncio era um lamento para o garotinho. Entre futebol, piscinas

e quietude, a vida ia. E foram várias tentativas para que o pequenino falasse sobre

tudo que o incomodava.


Em uma dessas oportunidades, se abriu um horizonte diferente. Uma visita com um

doutor se mostrou reveladora a ele. Doutor Zico (até hoje não se sabe se é o

verdadeiro nome ou um pseudônimo muito curioso) gostava de jogar cartas, o tempo

corria livre com o seu modo belo de embaralhar as cartas e distribuí-las na mesa. Ao

final de uma das conversas do garotinho com o Doutor, Zico o aconselhou: “Garoto,

não sei se já tentou um hobby para acabar com esse silêncio, mas procure tentar. Às

vezes, o silêncio pode falar.”


Numa tarde de terça, num violão de náilon gigantesco, surgiam acordes naquelas

cordas paradas. Lentamente, o silêncio pedia saída para um outro lugar, um outro

momento. Os dedos do garotinho faziam música, claro que desconcertante no começo

e um tanto perdido pelo tempo, mas sentiu de verdade a vida passar por suas mãos e

pés. E naquela tarde de terça, com a luz e o vento acompanhando sua canção, o

garotinho se encontrou no Sol.


Desértico Joe

5 comentários:

  1. Caro Desértico Joe, preciso dizer que me arrepiei com seu texto! O silêncio finalmente falou; no dedilhar do violão e a música desajeitada que quase consegui escutar daqui. Parabéns pela sensibilidade. Adorei sua escrita.

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  2. oii Desértico Joe, o seu texto está lindo e de uma sensibilidade sem tamanho, gostei muito no final você tirar essa angústia através da música fiquei muito feliz por você. Parabéns pelo texto e que você ainda fale muitas coisas para esse mundão.

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  3. Oi, Joe! Gostei muito do segundo parágrafo do texto, com tanta quietude e solidão, às vezes a gente esquece do Sol. Que bom que o garotinho encontrou cedo!!

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  4. Lindo texto, Joe! Me emocionei no final, parabéns.

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  5. Muito bonito o seu texto, Joe! É muito bom poder recorrer a arte e a natureza quando as pessoas e a nossa voz não são o suficiente. Fico feliz pelo garotinho ter se encontrado!

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