Em uma manhã chuvosa de agosto, ele partiu. Apesar da minha pouca idade – quando as
emoções geralmente são mais efusivas –, minha comoção, naquele cais do porto, não fora muito
exaltada. No entanto, tal emoção não me revelara que tornaria a habitar meu pensamento diversas
vezes ao longo de minha vida.
Esse primeiro que partiu, João era o nome, foi quem me fez conhecer a amizade. Nos
conhecemos no jardim de infância, e seguimos amigos até nossos sete anos, quando enfim partiu.
Além da escola, íamos ao parque, jogávamos futebol de botão, frequentávamos festinhas de
aniversário. Nossa irmandade era bastante sólida, e isso me fazia crer que seguiria pelo resto de
nossas vidas. Até que, sem muito alarde tampouco aviso prévio, chegara sua hora de partir.
Como disse, não tive uma reação muito grande na hora de sua partida, acredito que pelo
desconhecimento do sentimento que viria a me acompanhar: a solidão. Fiquei descrente da amizade
e me tranquei para o mundo. Não me interessava mais conversar com alguém para além do
essencial, do básico para o convívio humano.
Após alguns anos, inesperadamente, surgiu Joana. Apesar de todo o meu histórico de
resistência, ela fez com que eu novamente encontrasse a tal amizade (embora, confesso, vez ou
outra ultrapassávamos o limite desse tipo de relacionamento). Nossa ligação tornou-se intensa
muito rapidamente, e sem demora eu já havia apagado da memória a problemática “solidão”. O meu
coração estava, naquele momento, cheio de idealizações, esperança, alegria, gozo. Não me passava
pela cabeça que ela partiria abruptamente.
Mas foi isso que aconteceu. Nessa segunda partida, meu pesar foi imediato. Estava mais
uma vez mergulhado num imenso pote de tristeza. No entanto, diferentemente da outra, logo entrei
numa fase de conformismo. Àquele ponto, já havia descoberto que minha sina seria viver longos
períodos de solidão interrompidos por poucos e breves instantes de companhia. Nos meus muitos
anos de vida, considero que aprendi a conviver com esses encontros e desencontros.
O último que partiu foi o porteiro do meu prédio. Devo assumir que, em muito tempo, senti
uma preocupação inusual com uma partida – não sei quem irá sentir minha falta se, por algum
acaso, a morte me alcançar aqui do meu apartamento.
-Suco de Soja.
Gostei da forma como o texto me prendeu, muito boa escrita.
ResponderExcluirinteressante como o texto descreveu o processo de entrada e saída das pessoas na vida e a solidão, e o final do parágrafo gera uma boa reflexão para o leitor
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