Existe algo intrigante na combinação dos sons, o som do pé da cadeira se
arrastando ao acompanhar um micro ajuste de quem está sentado, a gritaria na sala ao
lado e os barulhos que circundam o prédio. Combinação sonora estranhamente
específica e que sem que eu perceba, lentamente me tira daquilo que deveria ser meu
foco: a leitura coletiva. Felizmente, o tecido da realidade puxa a minha consciência de
volta ao lugar onde deveria estar, permitindo que eu apreenda de todo o texto lido ao
menos duas personagens: Rômulo, que considerando a breve introdução que me foi
apresentada, pode ser descrito como um pianista obcecado pela perfeição, e sua esposa
Marisa, uma mulher socialmente oprimida.
Antes de tudo, destaco que é sempre válido almejar alcançar aquilo que sonha,
seja o seu sonho tocar a peça intocável de um compositor húngaro ou algo mais
convencional, como uma viagem para outro país. O incômodo que Rômulo me causou
não se encontra propriamente nesse aspecto, mas em seu desprezo direcionado a tudo
aquilo que não contribuí para seu objetivo maior, a inaptidão do pianista nas artes de
amar e compreender a trivialidade. Inaptidão que colide com a aptidão de Marisa nessas
competências, demonstrada principalmente pelo carinho direcionado ao filho do casal,
batizado com o primeiro nome do compositor húngaro Franz Liszt. Colisão que se
apresenta na forma de uma relação que seria definida perfeitamente como líquida por
Bauman: superficial e pautada pelo comodismo rotineiro.
Dentre os devaneios e reflexões trazidos por tal leitura, considerando as
impressões iniciais que obtive de cada personagem, reflito: há em todos nós um pouco
de Rômulo e Marisa, mas confesso que gostaria mais de habitar um mundo composto
por pessoas que possuem como face dominante o apreço pelas conexões humanas que
vivemos diariamente, do que o oposto.
-Alek Johnson
Amei seu texto! Achei incrível a forma como você começou seu relato e a reflexão que fez no final.
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