Devia ter Mandado uma Mensagem Curta
Nunca fui muito fã de instagram. A primeira foto que postei recebeu várias curtidas e comentários positivamente vazios. Não gostei. Na semana seguinte a postagem já havia sido apagada e meu instagram se tornou tão abandonado quanto qualquer página do orkut.
Durante os seis primeiros meses da pandemia eu gostava de me corresponder com meus amigos mais próximos por email. Nossa ideia inicial era se corresponder pelo email analógico mas, como meus pais já pagam internet mesmo, mandar um email era mais barato. Eu adorava escrever essas cartas e esperar por respostas. Era muito mais prazeroso do que o imediatismo quebrado das mensagens por whatsapp.
Em algum momento, tomado pelo sentimento desesperado de que o mundo estava prestes a acabar, escrevi um email para a Lorena. Enviei. Era uma longa carta eletrônica de amor que ela levou semanas pra responder e, quando finalmente o fez, foi com a intenção de deixar bem claro que estava cagando para a minha existência. Às vezes me arrependo um pouco dessa minha declaração via email.
A ociosidade ansiosa do isolamento pandêmico me fez recorrer à irrealidade do instagram e vi muitas coisas que me magoaram. Tudo o que eu sentia era saudade mas, pelo visto, todo mundo estava vivendo muito bem sem mim. Comecei a procurar indícios das traições que imaginava que meus amigos haviam cometido contra mim e, como eu queria muito, acabei encontrando. Por muitos dias não quis levantar da cama.
Acabei me levantando por insistência de minha mãe, que via minha apatia como "frescura". Mais uma de minhas palhaçadas. Já de pé, decidi que faria o mesmo. Decidi que ia mostrar pra todos como estou bem, mostrar a maravilha de ser eu!
Passei a postar qualquer coisa que escapasse à monotonia da minha vida. Quando fiz aniversário, dei uma festa com a família toda e postei muitas fotos com sorriso no rosto. Gravei vídeos dos convidados se divertindo e postei como se tivesse me divertido também. Quando saiu a série que tanto esperava, comemorei nos stories. Quando ganhei algo que queria muito, mostrei ostensivamente. Não preciso nem falar sobre quando fui ao cinema pela primeira vez depois de dois anos ou quando passei pra faculdade. Coisas tão empolgantes... Eu posto e todo mundo sabe.
Mas ninguém sabe do cabo de vassoura ou do blindex do banheiro quebrados em um acesso de raiva frustrada. Ninguém sabe da sensação opressora e indescritível de estar preso em um pesadelo que me acomete sem aviso prévio e torna o ato de respirar extremamente difícil. Ninguém sabe que fui abandonado por dois caras que já chamei de pai e é provavelmente por isso que minha mãe ainda me "superprotege", gerando uma relação que com certeza ainda me renderá muitas sessões de terapia.
Ninguém sabe que, apesar das fotos e vídeos engraçados que posto com minha irmã, ela não me abraçou no meu aniversário. Mal falamos um com o outro. Já não sabemos lidar um com o outro.
Ninguém sabe como me arrependo de ter mandado aquele email pra Lorena. Acredito que eu lhe seja insignificante demais para ela ter se incomodado em comentar com alguém, então ela deve ser a única além de mim que sabe dessa rejeição. É tão patético eu ter mandado essa carta declarando o que sentia... Devia ter mandado uma mensagem curta pelo whatsapp. Uma mensagenzinha assim, como quem não quer nada. Poucas palavras que, mesmo depois de enviadas, poderiam facilmente ser canceladas. Email não dá pra "desenviar". Eu tentei. Não dá pra cancelar. Email depois que vai não volta.
Por Akil Ubirajara
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ResponderExcluirCaro Akil, sinto muito que a Lorena não tenha correspondido ao seu sentimento. Eu me identifiquei na hora, porque também passei por algo parecido com uma amiga. Realmente, a gente não posta as nossas decepções nas redes sociais. E, com a pandemia, acredito que isso tenha sido muito difícil de ser vivenciado e superado.
ResponderExcluirGostei de como você construiu o seu texto, esse ciclo que se inicia com a primeira foto postada, pausa com a pandemia e é retomado com a sua vontade de partir para a ação, postando sua vida no Instagram. Obrigado por compartilhar conosco um pouco do que você é e do que faz parte dessa construção diária que chamamos vida.
Até mais
Querido Akil, seu texto me tocou muito, pois enviei mensagens para uma pessoa que eu considerava muito mas que até hoje não foram correspondidas, o sentimento realmente é horrível e seu texto mostrar muito bem tudo que você sentiu. Sinto muito que tenha passado tudo isso com suas amizades e espero que tenha conseguido encontrar outras que te façam bem.
ResponderExcluirFreddie Mercury