O brilho da criança que um dia fui se apagou muito cedo. Escrever era minha válvula de escape: com o lápis na mão, os gritos do quarto ao lado desapareciam. Os objetos quebrados, os telefonemas desesperados, tudo se apequenava pouco a pouco até sumir dos meus pensamentos. Naqueles instantes, eu era uma estrela do rock, uma princesa em apuros, uma imigrante ilegal em Tijuana, qualquer coisa, menos eu mesma. Não é fácil ser a parte mais fraca nessa hierarquia de violências que costumamos chamar de família, e era um grande alívio poder fugir para esses lugares imaginários.
Penso que algumas pessoas procriam por amor, outras por convenção social, mas muitos também o fazem pelo desejo de ocupar uma posição que nunca lhes foi permitida, um lugar de escuta sincera e interessada em meio a tantos silêncios forçados. O problema é que os ciclos se repetem. Um ser humano que aprende que é necessário deixar-se queimar tende a sujeitar o filho às chamas, convicto de que beijo e brasa são sinônimos. Foi isso que aconteceu comigo.
Uma escritura budista fala sobre Angulimala, um assassino cruel que guardava os dedos de suas vítimas e usava como acessório. Ao cruzar seu caminho, Buda pediu-lhe que cortasse o galho de uma árvore e depois o colasse de volta. O criminoso se viu desconcertado diante daquele pedido tão insano, e o mestre rebateu com a seguinte lição: “se você não pode criar, não tem o direito de destruir”.
Embora ache a história uma grande bobagem (se tivesse acontecido de fato, Buda jamais teria saído vivo para contar), gostaria de ter dinheiro para colocar essa frase em um outdoor na rua dos meus progenitores.
Querida Karmen,
ResponderExcluirInfelizmente entendo quando fala sobre traumas e progenitores, apenas saiba que: você não pode controlar os feitos à sua alma, mas pode controlar os impactos em seu psicológico e como reagirá!
Procure suporte e esteja preparada para encontrar uma saída saudável!
Se na consciência sabe-se que são ciclos repetidos, pense que talvez estejam fazendo seu melhor dentro daquilo que são capazes!
Sobre sua estrutura textual, apenas elogios! Sua história cativou-me dentro da riqueza de palavras e significados!
Agradeço por compartilhar conosco seus traumas e espero que possa saná-los com o tempo!
Com carinho,
Shaolin, o matador de porco
Karmem Chameleon, seu texto proporciona uma imersão no cenário que você quer compartilhar. Seu detalhamento realmente me fisgou. Consegui sentir sua angustia e revolta. A intertextualidade que você utilizou foi muito necessária.
ResponderExcluirE eu fiquei com uma pontinha de curiosidade se seus pais iria entender a mensagem ou só passariam por ela normalmente. Quem sabe esse projeto não se concretiza?
Abraços,
Liev.
Karmen, acho muito interessante seu texto ter, num primeiro momento, focado na fuga infantil da realidade. Gostei de como incluiu a escritura budista e uma leve ironia. Você soube terminar bem o seu texto, o q é muito difícil.
ResponderExcluirKarmen, sua crônica ficou leve e bem estruturada, mesmo com uma mensagem tão forte e profunda. Achei muito interessante como você amarrou o texto. Te desejo boa sorte nessa caminhada difícil que é o trauma e espero que você consiga soltar o grito que tem preso para seus progenitores.
ResponderExcluirKarmen, sinto muito pelos traumas gerados por seus progenitores, sei bem como relações familiares podem ser complicadas. Sobre seu texto, acho que poderia trazer mais clareza ao seu relato para facilitar a compreensão.
ResponderExcluirCo carinho, Aria.
Karmen, gostei muito da construção do seu texto. O encadeamento de ideias ficou excelente e a ironia ao final fechou brilhantemente o texto. Infelizmente, muitas pessoas não nasceram com o dom da paternidade e o fazem por convenção social. Espero, de coração, que um dia você se liberte desse trauma que tanto te aflige.
ResponderExcluirCom carinho, Elizabeth.
Karmen, consegui entender a angústia de sua própria família criar seu trauma, muito pesado e profundo esse assunto. Você conseguiu por meio da estrutura adotada me aproximar de seu texto e fazer com que a leitura se tornasse simples e prazerosa. O que mais me chamou atenção na sua produção foi o modo como você resolveu terminar o texto, me deixando com vontade de ler suas próximas produções. Parabéns.
ResponderExcluirQuerida Karmen, talvez uma das coisas mais frustrantes da vida seja procurar apoio e compreensão no colo daqueles mais amamos e estimamos, e não encontrar; por isso, sinto muito. Não deixe jamais que cortem suas ramificações, se deixe crescer, fluir, florescer! Você é a maior responsável pela sua vida e ninguém mais! Você prevalecerá! Ademais, sua escrita é impecável e o uso da história de buda foi genial! Floresça! Não deixe que o peso do passado te defina!
ResponderExcluirCom carinho, Ford.
querida Karmen, a forma como eu consegui imergir totalmente no seu texto foi incrível! Espero de todo o coração que você consiga quebrar este terrível ciclo e seguir em frente em paz.
ResponderExcluirCom carinho, Glória Maria!
"Um ser humano que aprende que é necessário deixar-se queimar tende a sujeitar o filho às chamas, convicto de que beijo e brasa são sinônimos". Karmen, querida, que frase forte, atingiu meu peito e me fez repensar sobre tudo aquilo que meus pais fizeram e ainda fazem comigo, e sua frase faz total sentido. Envio forças de quem também sofre abusos parentais. Beijos, Manu.
ResponderExcluir