sexta-feira, 19 de maio de 2023

A doença do capital

 Tem dias que a gente acha que estamos dentro de um filme, vivendo aquela cena onde tudo dá errado e nenhum dos personagens sabe o que fazer. Quando descobri que tinha câncer foi assim que me senti. Perdida, abandonada, e acima de tudo amedrontada.

  O medo tomou conta de mim imediatamente, as coisas horríveis que já havia escutado sobre os sintomas vieram à cabeça e pensei em cada uma das pessoas que conhecia que perderam algum ente querido que possuía o mesmo diagnóstico que o meu.

  Depois do primeiro choque e dos primeiros meses convivendo com a doença, percebi que a pior parte ainda não havia chegado, afinal, quando se vive no capitalismo tudo pode piorar. Por conta da doença não era viável nem possível trabalhar, as contas continuavam chegando e eu me via cada vez mais perdida e impotente. Pedi ajuda para todos que consegui, família, amigos, banco, ongs, me agarrava em qualquer possibilidade de melhora e de ajuda financeira. Ainda restava esperança.

  O tempo passou e a situação não melhorou exatamente, claro que o fato de estar viva por si só já era motivo suficiente para agradecer, mas as contas estavam atrasadas, eu me sentia cada vez mais vulnerável e a saúde mental já nem existia mais. Me dava raiva saber que em algum lugar existiam pessoas extremamente ricas, donas de um dinheiro que nem elas sabiam exatamente de onde veio, curtindo a vida sem se preocupar se teriam luz em casa no dia seguinte ou algo de comer na geladeira. 

  Me perguntava se eu tinha nascido errado, mas a verdade é que o sistema é tão horrível que nos faz acreditar que a culpa disso tudo é nossa, é do universo, é de qualquer um menos dele. Hoje em dia quando acordo cedo para mais uma vez ir atrás de algum jeito de pagar minhas contas, faço questão de lembrar que não é culpa minha, de Deus, ou do destino. É de um sistema falido que nos cega para que não vejamos sua podridão, e que caso consigamos ver, não possamos fazer nada a respeito.


  • Apollo Creed  

4 comentários:

  1. Gostei da perspectiva que você escolheu abordar, escrito em primeira pessoa como se fosse a propria Caroline

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  2. Muito boa o ponto de vista do texto a partir da Carolina e o grande vilão que você nomeia: o capitalismo. Excelente abordagem!

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  3. Achei muito interessante o uso de primeira pessoa, como se fosse um desabafo da própria Carolina

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  4. Excelente texto, sua escolha de fazê-lo em primeira pessoa é fantástica. Parabéns!

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