quinta-feira, 13 de abril de 2017

O que eu não quero ser

Passava um pouco mais das oito e meia e o jornal mal havia começado, no
entanto, os olhos atentos do rapaz de dezoito anos, já estavam se revirando em
órbitas, grunhidos de insatisfação lhe escapavam dos lábios e os pés impacientes se
remexiam pelo chão, não se aquietando em seu sofá. Ora, ele estava realmente
irritado. Fazia pouco tempo que decidira ligar sua TV, e para quê? Pra ver dois bobos
sensacionalistas falando o que todo mundo já sabe, porém de uma forma mais
bonita, com palavras difíceis, gráficos e tudo mais? Se acham o centro do universo,
os-sabe-tudo e donos de toda a verdade mundial. — pensava em segredo. Um cara
estava ao seu lado, era um dos moradores da república. Era uma acadêmico de
engenharia, mas adorava jornais, perdia sempre um tempo lendo o físico e vendo o
televisionado. Nosso protagonista não tinha para onde ir, e por isso dividia um sofá
com o colega de casa, e assistia ao noticiário.
Desde que o rapaz decidira morar em Niterói, ele vivenciava isso. Largou sua
família em outro lugar e se mudou para que ficasse perto da UFF, uma faculdade
qual queria estudar, porém o quê? Ainda não sabia. Estava na época do SISU, no
entanto, ele ainda não tinha feito sua inscrição por realmente não saber o que fazer.
Falava sobre isso com alguns amigos e todos riam, afinal, tinha dezoito anos, uma
cota de grandes acertos no ENEM, mas ainda não sabia o que queria, não sabia e
todos já sabiam. Será que o problema é comigo? — Pensava. Levou uma mão até os
cabelos lisos e os bagunçou um tanto. Suspirou e suspirou novamente. Aqueles dois
na TV ainda falavam e não pareciam parar nunca. Talvez tenha pego asco de
jornalistas por causa disso, porque geralmente quem tem toda a pompa, a honra e a
fama, são aqueles ratos de estúdio, que só saem na rua com seus carros caros, tem
casas em lugares privilegiados e pouco sabem do mundo real. Bobeira! — Murmurou
e riu sozinho, usando o polegar e o dedo indicador para modelar um lado de seu
bigode, bem aportuguesado, dando jus à suas origens. Fixou os olhos na TV e
molhou os lábios com a língua, ainda tentando superar sua grande irritação por estar
vendo o que já esperava, jornalistas iguais em todo o lugar. Poderia mudar de canal,
mudar de jornal, mas parecia estar vendo as mesmas pessoas. Apoiou-se nas coxas
com seus braços e olhou para o chão por um momento, estava pensando. Pensando
no que levava pessoas àquilo. O que eu faria se fosse um jornalista? O que eu
gostaria de mostrar para as pessoas? — Sussurrou a pergunta para si mesmo, ainda
olhando para o chão, unindo as mãos com dedos entrelaçados. Era uma boa
pergunta, afinal. A voz vinda da TV não ofuscava sua dúvida interior, agora a voz em
sua mente gritava mais alto: o que faria se fosse um jornalista?
De fato, não se imaginava em tal profissão, mas pensando bem, em qual ele se
imaginava? Talvez ele pudesse fazer melhor, talvez ele pudesse ser melhor. Talvez
ele quisesse aquilo, ser melhor. Seu ego inflou e ele sorriu, levantando um pouco a
cabeça, olhando para a TV. Eu posso ser um jornalista melhor, eu vou ser um
jornalista melhor. — Decretou em um tom razoavelmente alto, chamando a atenção
do garoto ao lado, o olhando de lado, um tanto confuso. Talvez a alma questionadora
de jornalista morasse no rapaz desde sempre, porém estava acordando só agora.

JACKSON

2 comentários:

  1. O texto adquiriu um tom literário e descritivo que me soou um pouco demais até. Talvez pudesse passar um pouco mais de emoção através de uma linguagem um pouquinho mais simples. Mas apesar disso, o final ficou bom. A referência ao caráter questionador do jornalista e associação à personalidade do rapaz foi mesmo uma boa sacada. Ah, e na última frase,creio que "estava" poderia ser substituído por "estaria". A mudança do tempo verbal fez a frase perder a sua essência subjetiva.

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    1. - Não é que esse Lukas entende das coisas, Mecânico?
      - Sim, fala bonito.
      - "tom literário que soou até demais". Uma boa definição. Algum trecho para embasar?
      - "Talvez tenha pego asco de jornalistas por causa disso, porque geralmente quem tem toda a pompa, a honra e a fama, são aqueles ratos de estúdio, que só saem na rua com seus carros caros, tem casas em lugares privilegiados e pouco sabem do mundo real"
      - Mecânico, por vezes você parece uma máquina.
      - Obrigado.
      - Sim, sim. Períodos longos, desnecessariamente longos. Palavras em demasia. Prolixidade. Se o jovem era assim, revolucionário, não era prolixo. Perdeu-se o sentido.

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