sexta-feira, 28 de abril de 2017

Os Filhos de Tupã

Araci é uma mulher forte e guerreira, devota à tribo Potiguara e mãe de dois filhos, Cauê e Rudá. Desde pequena viu seu povo lutar para não perder sua terra, já tão explorada e danificada por outros. Cresceu sob os ensinamentos de sua mãe, Ynara, protetora de seu povoado e de sua aldeia. Araci sempre fez de tudo para garantir que a tradição de seu povo prevalecesse em meio a violência propagada gratuitamente pelas grandes empreiteiras, que tanto faziam para tirar dela e de seu povo o que lhes é mais sagrado: o lugar onde moram.

Várias são as promessas não cumpridas, diversos os descasos com suas reivindicações. As conquistas que lhes são garantidas logo mostram-se irreais e ilusórias. A demarcação de suas terras, símbolo de vitória para toda a população indígena, perde o significado quando passa a ser banalizada pelo próprio governo. Seus direitos são extorquidos, sua cultura se fere com o desrespeito. Eles, no entanto, não se calam perante tamanha atrocidade. Com a cabeça erguida sempre dizem ‘’Vamos à luta! Somos filhos de Tupã!’’

Entretanto, algo diferente ocorreu na última vez em que se dispuseram a lutar. Não foram ouvidos, não olharam para eles. Não deixaram que trouxessem à público suas indignações. Foram recebidos com tiros e bombas, tratados como animais selvagens, como se fossem ninguém. Nesse momento Araci viu sua tribo sendo atingida, alguns caídos ao chão, outros correndo de um lado para o outro, o medo estampado em seus olhos. Em meio a tanta confusão, Araci caiu de joelhos. Com o olhar erguido ao alto, fitava o Congresso Nacional e dizia: ‘’É maior do que nós! Vai nos engolir!’’

Rudá e Cauê logo aprontaram-se para levantá-la do chão. Seus filhos seguravam seus braços enquanto ela sofria, amparada por eles e desamparada pelo Estado. Seu coração batia forte, suas pernas tremiam. Pela primeira vez em toda sua vida sentiu-se impotente, incapaz de mudar sua realidade. Em meio a todo o caos que estavam vivendo, Rudá tomou-a em seus braços e fez seu peito de abrigo. Não poderia desonrar o nome de sua família desse jeito. Determinado, gritou alto o bastante para que seus companheiros pudessem ouvir: ‘’Vamos deter Anhangá! Eles vão ter de nos engolir!’’

Louie Edmond

5 comentários:

  1. Achei interessante como a crônica "transformou" uma foto em história, dando-lhe rostos, nomes, características, sentimentos. É difícil não ler algo assim e visualizar toda a situação e consequentemente, refletir a respeito.

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  2. Muito bem escrito. Acho que você matou a segunda e a terceira pontas da estrela com uma frase só, "Vamos deter Anhangá!". A frase também é tristemente perene. As referências de Araci como mãe e Rudá com quem a abraçando são simplesmente sensacionais!

    Acho que você já conhece, mas assista "Uma história de amor e fúria" se puder. Diretor: Luiz Bolognesi. Muito bom!
    Abraço.

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    1. Obrigado pelo elogio e pela indicação, principalmente vindos de uma figura como a sua. Fico feliz.

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    2. Errata: como quem a abraça***

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