A porta de madeira se abre. Os patamares regulares levam ao topo. O pé direito, o esquerdo, o direito, o esquerdo. O ritmo das passadas. Os degraus. A escada dá boas vindas ao homem vestido de preto. O equipamento letal, metálico. Baratas saltam das paredes, voam pela cozinha, azucrinam o homem que dispara. Palavras. O formato fálico da arma remete a coisas várias. Inquieto, o homem sobe, desce, flutua, estremece os degraus da infeliz escada. Las cucarachas vuelan. Desespera-se então esse ser que confronta a caixa de gordura da casa. São tão fracas as baratas, capazes seriam de desfazer um plano de meses com a simples força do bater das asas? Las cucarachas vuelan. El hombre corre. A atmosfera sofre com os tapas mal direcionados. O desequilibrar. O olhar fixo aponta a barata alvo do golpe que segue. Puft. Transformado em patê o inseto ingênuo que nada fez ao humano! A gosma branca se espalha pela parede que habitava. Grudadas nos brancos azulejos as patas espatifadas, as antenas desnorteadas. O casco côncavo resume-se à planificação premeditada. A gosma branca escorre pela parede, como a porra que suja a cara.Las cucarachas vuelan. El hombre mata. Matara apenas uma das desagradáveis dezenas e centenas e milhares de baratas. A gosma branca. O armamento fálico. O ritmo das escadas. Os disparos, a pólvora, o plumbo. Os projéteis escoam pelo cano em formato de rola. Férteis como porra, capazes de tirar vidas diversas, sequer encostam no marrom das baratas. A enxame dispersa-se com o agudo dos tiros. A cozinha enegrece, tomada pelo revoar dos insetos.
A gosma branca. O armamento fálico. O ritmo das escadas. A colcha é confortável e quente, como a porra cuspida pela uretra. Os travesseiros recebem o abraçar das pernas. A noite é úmida e prazerosa. Las cucarachas son guardias. O homem de preto abandona a invasão da casa. Las cucarachas son madres. Na noite de sexo imaginário, o homem de preto foge. Tarado. Não invade por ouro, prata ou bronze. É o ato que nos consome, a vontade, o gozo. A gosma branca, o armamento fálico, o ritmo das escadas. É pelo sexo que passamos noites em claro e pelo sexo, também, dormimos.
Zé Zepilim
Las cucarachas vuelan, viu, meu amigo?! Que texto bom. Eu o li duas vezes, e confesso que ao lê-lo em voz alta, soa perfeitamente bem. És incrível a sonoridade com o jogo de palavras que você fez. Estou sem ter o que dizer para essa crônica. A escrita está ótima, envolvente, tem um tom dramático, e eu posso até ouvir aquelas musiquinhas de fundo. "Hoje eu vou dormir cedo" e 03:14 da manhã eu estou aqui batendo digitando com os pés porque minhas mãos estão ocupadas batendo palmas para essa crônica. Adorei. ;)
ResponderExcluirAmei o texto, achei super arrojado e fiquei presa do início ao fim! Parabéns!
ResponderExcluirMe lembrou os filmes do Cronenberg. Barata dá pano pra manga, né... Ô bicho filho da puta. Mais uma crônica reafirmando sua habilidade com escatologia
ResponderExcluirAdorei toda essa estética escatológica da crônica, continue nesse estilo. Vem dando bastante certo
ResponderExcluirAcho que você já se estabeleceu confortavelmente em tal estilo, e ainda bem. Mais uma vez bem ritmado, bem escrito, criativo e de fato, ótima forma de abordar sonhos eróticos, fugindo da obviedade. Compraria um livro teu.
ResponderExcluirSimplesmente me MIJEI de rir, sem exageros. Literalmente. Escorreu uma urina quando eu li a parte em espanhol. Que crônica!!! Imagino o Pena facilmente anotando diversas coisas no quadro pois tenho certeza que você foi um ponto alto, pelo menos pra mim.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirAmei a crônica! As passagens em espanhol são as melhores e foi um ótimo e diferente jeito de ver um sonho erótico.
ResponderExcluirCrônica muito envolvente e bem escrita. O link entre os dois assuntos do texto foi feito de maneira sutil e quase imperceptível aos olhos do leitor. Notei, apenas, um pequeno erro no uso do artigo em: "A enxame", que deveria ser substituído por "O enxame". No todo um excelente texto, parabéns.
ResponderExcluirConseguiu deixar bem envolvente e a repetição do "La cucaracha" deixa a gente sempre esperando a próxima vez que vai aparecer haha
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