Era noite, ruas escuras e vazias. Sentia-me obrigada a desvendar aquele caso. Sentia-me obrigada a fazer justiça. Assim, entrei naquela casa, pequena, sombria, mau cheirosa. Sentia calafrios horripilantes e cada parte de meu corpo arrepiar-se. Sentia vontade de correr dali, de chorar e de me esconder. Como expor para a sociedade algo tão cruel? O estupro e o assassinato de uma criança de apenas 5 anos.
Ela era linda. Cabelos claros, olhos verdes, bochechas fofas e um sorriso contagiante. Porém, agora, só fazia parte de uma memória.
Dentro daquela pequena casa, fechando os olhos sentia-se com muita facilidade o vazio, os momentos horríveis, a angústia e o caos a que Lívia foi submetida.
O medo tomava conta de meu corpo, mas meu senso de justiça falava mais alto, agora tomava para mim a missão de desvendar quem havia feito tamanha crueldade com aquela criança.
Na sala, roupas para tudo quanto era lado, vestígios de uma tentativa de incêndio. O estuprador ateou fogo à casa, fazendo com que se tornasse mais dificultoso qualquer tipo de investigação.
Vestígios, indícios - e uma intuição que nunca falhava - diziam-me que havia sido o pai de Lívia. Seu próprio pai havia estuprado e matado-a.
Mais determinada do que nunca, vou entrando escombros adentro e ao chegar no quarto, onde todo o crime foi praticado, encontro paredes sujas de sangue - logo parei. Não esperava por aquilo. Não me deixei abalar por completo, vasculhei todos os cantos, e embaixo do colchão queimado, sujo e fedido, encontrei.
Numa letra simples, de quem ainda está sendo alfabetizada, encontrei um diário quase que destruído pelo fogo. Folheando as páginas rápido, com o coração acelerado e os olhos cheios de lágrimas encontro o que eu já esperava.
Lágrimas saltam de meus olhos. Não consigo segurar a emoção. Doeu. Eu sentia a dor daquela pequena menina.
Abraço aquele pequeno caderno e levanto-me determinada e certa de que eu tinha todas as provas. Ele pagaria.
Quando saio em direção à porta, vejo uma sombra. Era alta e intimidadora. Meus olhos se arregalam, o medo volta a tomar conta de meu corpo e eu acordo assustada, suando frio. Não passou de mais um pesadelo. Ou melhor, de novo o mesmo pesadelo. A repetição desse sonho faz-me pensar: Quantas “Lívias” precisarão morrer? Quantas crianças existem na mesma situação? O que iremos fazer?
Apenas Lispector
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