– Qual caminho você escolhe? – escutei uma voz atrás de mim. Virei-me na hora, e surpreendi-me ao avistar um homenzinho com feições infantis e cabelos dourados como trigo. Alguém normal fugiria – mas eu não sou normal. Então perguntei aonde levava o caminho de solo arenoso e ele me contou sobre seu lar – pequeno, com vulcões inativos e baobás gigantescos:
– Lá tem um pôr do sol lindo! Mas tenho que voltar logo, passei muito tempo fora. Minha rosa deve estar preocupada; não que ela admita isso, claro. – ele deu uma risadinha. – Quer ir comigo? – ofereceu-me, mas apreensão tomou-me ao imaginá-lo sozinho em meio a rosas, vulcões e baobás, então lhe perguntei quem era o responsável por lá. – Ninguém. Autoridade pra quê? Cuido da minha rosa, ela cuida de mim. Sempre cabe mais um; quer ir comigo?
Fiz que não com a cabeça e agradeci mesmo assim; recebi em troca um mero aceno do homenzinho antes de ele seguir pelo seu caminho. Fui pela estrada de terra sem olhar para trás – verdade seja dita, eu estava olhando para lugar nenhum: a conversa me desnorteara; eu não conhecia mais o meu rumo. Nem me assustei ao ouvir uma voz súbita:
– Não dê mais um passo sequer. – era uma menina com longas madeixas loiras, sentada sobre uma pedra às margens da estrada. Ela apontou para o buraco à minha frente, que me passara despercebido. – Confie em mim quando digo que você não quer cair aí. – Ela logo se explicou: – Lá embaixo é cada um por si. Todos estão sempre com pressa porque tempo é dinheiro; estão sempre atrasados. Num instante você é gigante, é bem sucedido e todos te conhecem; noutro, você é menor que um grão de poeira, é um ninguém porque perdeu tudo.
Eu não sabia o que dizer – por sorte, ela era solícita e me poupou de falar algo tolo ao me indicar como desviar do buraco para seguir em frente. Agradeci pela sua ajuda e lhe dei um tchau quase inaudível – o encontro com o homenzinho tinha sido certamente mais agradável. Depois disso tudo, prossegui com grande cautela – principalmente após alcançar uma parte em que a estrada fora pavimentada com tijolos amarelos. Dessa vez, vi a estranha primeiro:
– Está sem rumo? – a menina de cabelos castanhos e trançados perguntou, e eu logo assenti. Indaguei o que eu encontraria se seguisse aquela estrada, e ela me deu um sorriso desanimado: – Não há muita coisa. Nosso líder é um mentiroso, diz que ajudamos uns aos outros, mas só alguns cidadãos vivem em boas condições de fato. Faça algo de errado e o exército desaparecerá com você. – seu semblante abatido me comoveu. – Você quer seguir em frente? Não sabe seu destino ainda? – para frente não vou, foi meu único pensamento diante da sua pergunta. Alheia à minha reflexão, a menina tirou seus sapatos prateados – Sei que isso é estranho, mas não me questione, ok? Faça o que eu pedir. Vista esses sapatos, você parece precisar deles mais do que eu. Certo, isso mesmo. Agora feche os olhos, pense aonde você quer ir e bata seus calcanhares três vezes. Adeus. – e tudo ficou preto.
Encontrei-me na passagem arenosa que dá caminho ao lar do homenzinho de antes, e me senti contente com esse destino, com esse rumo – afinal, autoridade pra quê?
Cora
Que texto incrível! Gostei muito da riqueza de detalhes que você deu sobre as pessoas, as sensações e o lugar e acredito que, com isso, você potencializou os recursos do jornalismo. Notei também o ultrapassar dos limites do cotidiano, o rompimento com o lead e perenidade. Seu texto pode (e deveria) ser lido por muitas pessoas e por muito tempo! Parabéns!!!
ResponderExcluirGostei muito da mesclagem do real com o ficcional, Cora. O texto aborda a política de uma maneira sutil, subjetiva e leve, sem a tensão habitual das discussões e dos ''textões''. Parabéns pela criatividade.
ResponderExcluirQuanto à pontas da estrela, pude notar que seu texto possui características como a potencialização das técnicas jornalísticas (a exemplo da descrição de personagens e locais) e do rompimento com a tradicionalidade do lead, entre outros aspectos que dão ao texto uma identidade única.
Que criatividade!!! Adorei seu texto. Como disseram Simone e Spencer, a riqueza de detalhes é visível e faz com que seu texto reforce os recursos jornalísticos. Percebo que rompe com o lead e que seu texto tem perenidade, pois sua invenção tem força para permanecer no tempo.
ResponderExcluirQue criatividade!!! Adorei seu texto. Como disseram Simone e Spencer, a riqueza de detalhes é visível e faz com que seu texto reforce os recursos jornalísticos. Percebo que rompe com o lead e que seu texto tem perenidade, pois sua invenção tem força para permanecer no tempo.
ResponderExcluirOlá amiga Cora! Seu texto me trouxe a sensação de estar lendo um livro e ainda me pareceu estar vivenciando tudo o que você descreve. Você relata os detalhes de forma clara, trazendo ao leitor uma sede pela história contada. Com toda certeza você potencializou recursos jornalísticos, rompeu o lead e claramente contém perenidade. Parabéns seu texto é simplesmente maravilhoso!
ResponderExcluirBeijos perfumados de sua querida Maria Antonieta.
Muito bom texto, parabens. Concordo com os comentários anteriores, sensaçao de ler um livro, criatividade e riqueza de detalhes. Vejo que você rompeu com o lead, se preocupou com os recursos jornalísticos e, principalmente, o quanto você ultrapassou os limites do cotidiano. O texto tem identidade e gostei bastante da sua escolha no estilo.
ResponderExcluirAchei muito interessante a sua forma de abordar o tema, tornando a leitura mais atrativa e instigante. Percebo uma visão ampla da realidade, rompimento com os limites do acontecimento, perenidade do texto e universalidade. Além disso, não ignora técnicas jornalistas, como a observação e apuração dos detalhes. Parabéns!
ResponderExcluirVou repetir as coisas já ditas pelos meus colegas: o texto está realmente muito criativo! Extremamente profundo, vai - com certeza - além da realidade, não se prende ao lead e acho que potencializa os recursos jornalísticos.
ResponderExcluirOla Cora! Adorei o seu texto! A história nos prende causando um reconhecimento imediato com o universo do texto! Adorei a quantidade de detalhes que você adicionou e isso acrescentou muito ao texto. Em relação à estrela, acredito que você rompeu as barreiras do lead, usou das técnicas jornalisticas, apresentou uma visão ampla da realidade e garantiu o uso da perenidade. Parabéns!
ResponderExcluirMônica do Legião
Cora, o texto ficou muito bom. Com sua criatividade, conseguiu de forma sutil criar uma analogia sobre um sistema bruto que é o fascismo. Quanto às pontas da estrela, acredito que apresentou visão ampla da realidade (nua e crua), rompeu com as barreiras do lead e de certa forma foi perene também. Meus parabéns!
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