Quando em 1984 Byafra imortalizou
o verso “voar, voar, subir, subir”, eu ainda não existia. Na
verdade eu estava relativamente longe de dar as caras no mundo. Eu
estava longe de aprender a andar de bicicleta, longe de ganhar meu
primeiro videogame, longe de desenvolver meu gosto por sorvete de
uva. E, mais do que isso, eu estava bem longe de conhecer minha
paixão por viagens. Foi só depois de velha que escutei essa
obra-prima da música nacional e me peguei, mais do que nunca,
imaginando como seria voar. O que acontece é que, por mais que eu
ame conhecer novos lugares, nunca voei. Eu não faço ideia de como é
viajar de avião. E é com essa faísca de imaginação que um dia
tive um baita sonho.
Embora não saiba o que é viajar
de avião, sei muito bem como é viajar de carro, de moto, de
charrete (!), e, claro, de ônibus. Essas experiências se fixaram na
minha cabeça, seja porque foram momentos marcantes, seja porque é
na terra que eu me locomovo e não tinha como isso não ficar gravado
aqui dentro. Certa noite as lembranças dos passeios por terra se
fundiram com a imaginação do voo. Eu sonhei que finalmente estava
em um avião. Mas aquilo não era nada como eu imaginava. Nem nos
meus mais distantes pensamentos poderia imaginar que um avião andava
sobre rodas, nas estradas, como os ônibus. Que droga! Esperei tanto tempo pra
isso? Pra continuar andando em estradas? O quão grande foi minha
decepção quando vi o avião parando na beira da estrada para pegar
mais passageiros? “Será que aceitam bilhete único?”, me
perguntei. Minha frustração passou por Santos Dumont, pela NASA,
até pelos Irmãos Wright. Isso só podia ser coisa daqueles
estadunidenses safados. E Byafra, por que me enganaste tanto assim,
Byafra?! Sua admiração pelos balões gerou minha admiração pelas
aeronaves, e agora tudo estava arruinado. Não aguentava mais ver o
avião na pista lenta tal qual um Fusca sexagenário. Nem ao menos na
primeira classe eu estava. Minha decepção durava uma eternidade.
Aquele avião era um enorme 38 rumo à Itacoatiara em um domingo de
verão.
Acordei. Acordei bastante
desapontado. E ainda não sei como é viajar de avião. E aqui estou
eu, escrevendo isso sentado em um ônibus, tomando sol na cara. Assim
como rogou o caozeiro do Byafra, “eu sou assim, brilho do farol,
além do mais, amargo fim, simplesmente sol”.
Misty Martinez
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