sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Cataclismo

Eu costumo repetir pra você desde que nos conhecemos, que contar um sonho é o mais íntimo ato que você pode fazer com alguém. E você, logo você, que sabe exatamente os gatilhos que os pontos do meu corpo tem e os tons de agudo que meu gemido faz, mesmo assim, talvez nunca tenha me visto em tamanha redenção.
Chovia. Chovia muito. Chovia torrencialmente e estávamos em uma casa que não é a sua, mas parecia ser. Num lugar que não era o nosso, mas que você conhecia bem. Todas as saídas tinham sido bloqueadas por conta de um tiroteio próximo que eu não lembro de ouvir os tiros. Lembro que tinha uma mulher e reconheço por ela volta e meia pegar o ônibus comigo. Não faço ideia do que ela estava fazendo ali conosco.
Era um sonho simples, sem muita imaginação ou agitação, apesar do seu caráter extremamente pesado: Estávamos sentados nós três, esperando a chuva passar para que eu pudesse ir embora. Você disse que eu poderia ficar e eu acreditei. Até que você deu o meu toque de recolher, do nada, como um suspiro indiferente ou uma decisão que tomamos por pura rotina.
Vai embora. Sai daqui, só sai.
Mas.
Sai. Você continuou imperando. Sai, sai, sai, sai.
Está chovendo, está chovendo muito, eu gritava de volta. Você sabe que tenho medo de tempestades.
Sai.
Sai.
Então saí.
Acordei.
Suava como se tivesse de fato pego chuva.
Uma vez li que água em sonho significa como seus sentimentos estão dentro de você, e dependendo dos aspectos em que ela se apresenta, isso determina como andam todos eles. Dilúvios, águas turvas e escuras: problemas.
Eu repito, contar um sonho é o ato mais íntimo que se possa ter com alguém, e mesmo assim cá estou eu, aqui, num completo desnude literário em meio a uma turma inteira, sob um véu de um pseudônimo que não me garante um anonimato pleno e sendo lida com uma voz que provavelmente não é a minha. Eu estou aqui, mostrando o meu Eu mais profundo, aquele que nem eu mesma costumo encontrar muito.
Eu estou aqui, de peito e braços abertos.
E Você, me conhecendo, sempre soube que meu maior medo era o de tempestades. Bastou eu experimentar a ideia de te perder, pra descobrir que na verdade o pior tipo de cataclismo seja o de você me mandando embora.

Skeeter

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