Estava muito calor,
disso eu me lembro. O ar dentro do ônibus pouco vazio estava pesado, e o vento
que entrava pelas janelas era ainda mais abrasador. Mas sempre foi assim
voltando da escola. Os buracos pelo caminho atrasava a passagem do ônibus que
já não era lento o bastante. Acabei me acostumado, ou pelo menos me conformei
com a minha situação. O cheiro de suor das pessoas se misturavam tornando ainda
mais difícil a tarefa de respirar, e eu já não sabia se o odor vinha de mim
mesma ou das outras sardinhas naquela lata conhecida como transporte público.
Eu sempre carregava
um livro para ocasiões tediosas, e aquele 2014 estava repleto dessas
oportunidades. A solidão era minha amiga, e os livros, meus amantes. Mas
naquele dia não havia livro que me salvasse, e o jeito era aturar aquele
caminho só com meus devaneios que de vez em quando me assustavam.
Olhei para o lado e
ele estava lá. Sem um sorriso no rosto, sozinho como eu. Vestia uniforme de
escola particular, enquanto eu, usava a camiseta mais limpa que encontrei
naquela manhã. Ele olhava para fora da janela às vezes, ou pousava os olhos em
seu colo. Não conseguia reconhecê-lo, porém sabia que me era familiar. Mas de
onde? Desisti.
O tempo não passava
e ele ainda estava lá. Meu ponto era o último, será que o dele também? E se eu
fosse falar com ele? Achei que seria constrangedor para ambos, afinal, o que eu
diria? Podia perguntar se eu o conhecia de algum lugar, não é? Mas ele me acharia
estranha, e eu não queria ser estranha. Foi quando eu vi que ele carregava um
livro, o que era raro de se encontrar por ali. Não conseguia ver a capa, e isso
estava me matando. Talvez se eu conseguisse ler o título, eu poderia puxar um
assunto. E se eu não conhecesse o livro? Desisti.
O ônibus já estava
bem mais vazio, mas continuava calor, e ele continuava ali. Eu queria que ele
viesse até mim, facilitaria tudo. Mas por que ele o faria? Quem foi que disse
que ele estava olhando para mim como eu para ele? Estúpida, eu podia simplesmente
levantar e sentar ao seu lado. Não fui. Mas ele levantou. Alto, esticou o braço
e puxou a cigarra. Olhei para qualquer um dos lados que não fosse em sua
direção, e quando me virei para frente, ele já estava na porta. O livro fechado
em sua mão, a capa ilustrada do J.R.R Tolkien despertou uma exclamação alta e
involuntária "Ei, eu já li esse livro!". Mas ele não ouviu, e saiu
sem olhar para trás.
Voltei para casa
naquele dia pensando o que teria acontecido se eu tivesse ido até ele. Eu
queria ter sentado ali ao seu lado, conversado sobre a Terra Média e perguntado
seu nome. Queria saber se eu o conhecia de algum lugar, e se ele me olhava do
mesmo jeito. Mas quer saber? Hoje eu tenho as respostas para todas as minhas
perguntas.
Emma Woodhouse
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