sexta-feira, 9 de outubro de 2020

A nova donzela de ferro

 A cada mês, uma novidade, um novo procedimento estético, uma característica física  diferente a se almejar. Trocamos de preferências mais rapidamente do que de roupa. 

 Sobre o tema, caberia discutir o conceito da "Donzela de Ferro" que Naomi Wolf, escritora  feminista estadunidense, discute em seu livro "O Mito da Beleza" (1990). A ideia é uma  referência a um instrumento medieval de mesmo nome, que era utilizado para tortura e  execução de pessoas, enclausurando-as em uma espécie de molde de corpo humano. A  autora o adapta à contemporaneidade, associando-o ao ideal de beleza feminino imposto  pela sociedade, o qual é alimentado incessantemente pelo capitalismo. 

 Ouso afirmar, porém, que a nova donzela de ferro se converteu nas redes sociais. Agora ela  possui harmonização facial, rinoplastia, preenchimento labial, silicone dos variados modos,  lipoaspiração, sem citar muitos outros. Qual desses termos você reconhece? Já refletiu onde  consome conteúdo sobre esses procedimentos? Quantas influenciadoras que você segue  realizou algum deles? 

 Sua maior expressão na atualidade é o Instagram. Nele, a vida é retratada através de filtros  irreais, que tem a capacidade de modificar a noção de realidade e a ideia sobre nossa  aparência. Podemos nos comparar com fotos editadas, com modelos cheias de modificações  corporais e com vidas regadas de privilégios. 

 E o molde se estreita cada vez mais. No fundo, nenhum de nós poderia caber perfeitamente  nele, apesar da Internet nos vender a ideia de que é possível. É justamente esse o propósito:  vender. Quanto mais o objetivo de encaixar-se na donzela é perseguido, mais ela é  modificada. Se não há linha de chegada, o lucro (e os danos psicológicos) são constantes.  Definitivamente, o dólar vale mais que eu.



                                                                                                                 Estela Lia
                                                                                                            

11 comentários:

  1. Estela, estou apaixonado pela sua crônica. Nossa, perfeita do início ao fim. Meus parabéns.

    ResponderExcluir
  2. Atualmente com os filtros as pessoas se cobram cada vez mais, querem se parecer com o molde, como vc disse. Parabéns pela crônica!

    ResponderExcluir
  3. Parabéns pela crônica, texto muito bem escrito. Só não entendi a última frase "o dólar vale mais que eu". Poderia me explicar por favor? Achei um pouco desconexo do texto.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi Michael! A última frase eu citei um trecho da música "Tá Com Dólar, Tá Com Deus" da Francisco El Hombre, mas talvez tenha ficado desconexo do texto mesmo. Quis fazer a referência no sentido de colocar o lucro desses padrões estéticos acima da vida e da saúde mental das pessoas.

      Excluir
  4. CIRÚRGICO!
    Simples e extremamente pertinente. Argumentos super bem colocados e reflexão necessária. Parabéns.

    ResponderExcluir
  5. Posso estar sendo chata, mas percebi um erro de concordância no final que me incomodou bastante. Sobre o conteúdo, só tenho a parabenizar! Usou um tema muito importante e soube problematiza-lo de uma forma ótima

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, Cigana! O erro que você comentou seria a frase final em si? Obrigada pelo comentário.

      Excluir
  6. Gostei da referência ao conceito da Naomi Wolf e o texto está bem escrito. A frase final me impactou, "Definitivamente, o dólar vale mais que eu."

    ResponderExcluir
  7. Gostei da sua escrita e do tema, algo muito real e importante, que você conseguiu desenvolver muito bem ao longo do seu texto. A referência também foi muito boa e se encaixou perfeitamente. Não tenho críticas negativas, mas talvez ficasse ainda mais interessante com mais criatividade e dinâmica. No mais, não tenho um olhar tão pessimista, acho que, comparando com o passado, algumas vezes o molde se alarga ao invés de se estreitar (mas isso é só uma questão de opinião, não influencia em nada a qualidade do seu texto).

    ResponderExcluir
  8. Só comentei para dizer que estou sem comentários, ótimo texto.

    ResponderExcluir