Cheia de vazios

 Sentei pra escrever ontem.

Cinquenta e três minutos. O cursor ficou ali piscando, a folha vazia diante de mim, a tela

querendo entrar em descanso e eu relutando para não a deixar descansar, o cursor seguiu

piscando...

Hoje

Num mar de gente, mas não consigo me sentir onda. Não lembro de já ter me sentido.

Você já se sentiu onda nesse oceano?

Sinto-me barquinho com pequenos furos, solto e sem rumo em alto mar.

Estática em meio a uma multidão, sinto o medo constante das altas ondas que podem chegar,

e eu não sou uma delas...

e

s

t

o

u

afundando.

Parece consenso pra quem vive nesses grandes oceanos de pessoas, a solidão soa como um

sentimento coletivo. Sentir-se só mesmo em meio a uma imensidão de gente. Quem nunca?

No trem, no ônibus, na lotação às 17h30, fones de ouvido tapam o silêncio ensurdecedor do

barulho de uma multidão que pouco ou nada fala.

Mais um dia. A pressa é constante e está bem ao lado, nas ruas, nas calçadas, nos horários de

almoço curtos e indigestos.

“Olha pra frente, @!#*%.” Nem deu tempo de responder, a pressa era tanta que saiu falando

com a boca cheia de quarta-feira, feijoada.

A gente tenta pertencer aos grupos, tenta pertencer ao todo, quando na verdade, está

completamente espatifado, tanto o todo, quanto a parte.

Ao menos o cursor avançou algumas linhas.

Amanhã, mais um dia.

Pressa de tudo e vontade de nada

Os vazios tão cheios são os que mais me assustam.

                                                                                        Joana da Rua