sexta-feira, 6 de maio de 2022

Acredito que autossabotagem caiba exatamente no que me aconteceu hoje: achei que fosse escrever esse texto e enviar antes da meia noite, mas já é uma da manhã e eu nem sei o que falar. Não sei o que falo porque é fácil falar sobre o que te causa estranheza, mas a autossabotagem não me causa nada, ela é como uma velha amiga.


Por vezes, vejo meu corpo cansado, olhando a vida que me cerca, os amigos existindo e conquistando coisas e me pergunto se um dia a minha hora vai chegar. É nessa hora que, como toda pessoa normal, eu me levanto e decido tomar um rumo, fazer algo novo. Então, ela chega, como se não fosse ficar por muito tempo, mas faz um café, se senta ao meu lado e acaricia meu rosto com carinho e calma. Eu devo admitir: eu a deixo ficar. O conforto trazido por saber que, com ela, não preciso fingir ser quem não sou ou sequer criar máscaras de ambições, vontades, desejos ou perspectivas incríveis de vida.


Ela me deixa ser vulnerável, ser fraco, ser nada. Eu finjo que não passa um pensamento pela minha cabeça, aceito seu aconchego e me encolho, como um nada debaixo de uma coberta. 


Mas não se engane: ela não fica para sempre. Quando sua despedida, rápida, acontece, ela faz questão de dizer que não foi culpa dela, seus carinhos não eram tão bons assim, eu que me deixei levar pelo momento e entendi tudo errado. Eu deveria ter feito aquele trabalho, deveria ter tomado aquela atitude, deveria ter respondido aquela mensagem antes que ficasse tarde e embaraçoso demais para dizer que estava com saudades de ouvir a voz dele. Então, vem a culpa. “Se eu não decidisse que eu não tinha a capacidade de fazer aquilo, já estaria feito.” Mas aqui vai um comentário sobre as decisões: elas já foram tomadas quando chegamos ao ponto de falar sobre elas. 


Não sei mais se esse texto segue a lógica que deveria ou a lógica que eu, em minha infinita autossabotagem de achar que não sou o bastante, achei que deveria seguir. Só sei que, hoje, aceitei seus carinhos e até bebi um pouco do café que ela me ofereceu. Faz bem encontrar velhos amigos de vez em quando.

Por Nico

4 comentários:

  1. Parabéns pelo texto, Nico! A maneira como você abordou o tema, com forte presença de figuras de linguagem, deixou seu texto rico e envolvente. Esse ciclo de acomodação e arrependimento realmente quebra qualquer um.

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  2. Querido Nico, parabéns pelo texto, a forma como você construiu foi muito boa, principalmente com essa "aproximação" com a autossabotagem.

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  3. Ah Nico, que sensibilidade! Crônica excelente! Acredito que a autossabotagem soe para muitos exatamente como você descreveu: uma velha amiga, daquelas que deixamos entrar na nossa casa mesmo sabendo que não nos fazem bem, seja por apego ou força do hábito, é mais confortável a sua presença do que remexer em nossas feridas e ter de expulsá-la.

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  4. Nico, querido, que texto incrível. Amei a forma que você caracterizou a autossabotagem. Beijos, Manu.

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