sexta-feira, 20 de maio de 2022

O nome é de assassino de suínos, mas as palavras são de um coração remendado

Shaolin, o matador de porco. Se estivéssemos num mundo paralelo onde os porcos tivessem evoluído maleficamente a ponto de se tornarem ameaças à vida terrestre, esse seria o nome de um grande herói. No entanto, nesse nosso lúdico mundo digital, é um nome (diga-se de passagem) muito inusitado que me fez rir a primeira vez que li um texto dele. Não ri pelo nome ser engraçado, no entanto, mas pelo fato de uma pessoa com tanto senso de humor ser capaz de escrever coisas tão tristes.

Em seu primeiro texto, você fala de suas máscaras, e de como usá-las por tanto tempo te fez ser incapaz de reconhecer a si mesmo. Já em “Por que eu amo o que não sou?”, fui atingido por um dos trechos que mais gostei de todos os textos que li. ”O sorriso perfeito, as notas exatas e as felicitações irreais. Eu amo o que eu sou, mas eu não sou o que eu acho que sou.” Essa frase foi capaz de transcrever claramente o sentimento do autor, e além disso foi o suficiente pra espelhar esse sentimento em mim. Em “O que a gente poderia ter sido”, você trata de uma sensação provocada pela autossabotagem, que dialoga completamente com o que você trabalhou em “A máscara”. Justamente sua incapacidade de se reconhecer e ser sincero consigo mesmo, rompendo as aparências, é o que gera sua insegurança na hora de se sentir digno ou pronto para receber e retribuir um amor do qual você fugiu, por medo. E, por último, em “Os fragmentos de quem eu sou jamais serão contados por mim”, você coroa a melancolia dos textos anteriores com a triste reflexão de que a sensação de que podemos quebrar novamente é pesada demais para quem já esteve na beira do abismo.

Caro Shaolin, minha função nesse texto não é falar do seu caráter, porque não o conheço.

Não é falar da sua estrutura textual, porque faço questão de tecer elogios nos comentários de suas publicações.

E também não é supor qualquer coisa a respeito de quem você seja, ou denunciar sua identidade. 

Estou aqui pura e simplesmente para falar, que, lendo seus textos, eu percebo uma pessoa que por mais que tente disfarçar o que sente através das máscaras, – elemento sempre presente nas suas narrativas – carrega dentro de si um enorme cansaço. Como disse em meu último texto, nunca tive muitos amigos, então as palavras escritas muitas vezes me fizeram companhia. Por isso, aprendi inconscientemente a detectar o que as palavras querem dizer e o sentimento que elas carregam, mesmo que sem total exatidão. Lendo seus textos, meu coração dói muito. Enquanto digito essas mesmas palavras que você lê no momento, sinto vontade de chorar. Você não diz, mas nos faz sentir o peso dos seus fardos, e por Deus! Como eles são pesados! Só de pensar no quanto você teve que suportar, em todos os sentimentos que você precisou reprimir... Não posso imaginar o quão difícil deve ter sido chegar até aqui. Minha essência empata quase pode me fazer ouvir os seus soluços, e isso me faz querer ser capaz de tirar essas cargas de cima de seus ombros e colocá-las sobre os meus. Você passou por tanta coisa, sozinho, e hoje é alguém calejado, com um coração feito de remendos da experiência.

Por mais que você faça trocadilhos com suas palavras, seja receptivo ao nos chamar calorosamente de companheiros e tenha um carinho enorme ao comentar os textos, isso tudo não me deixa parar de pensar no quanto isso apenas esconde seus pesos. E isso machuca em mim.

Por isso, queridos colegas escritores, posso dizer com clareza que Shaolin, o matador de porco, pode não ter nome de herói, mas com certeza cativou meu coração. Ele faz questão de dar a todos um afeto e atenção preciosos, sendo sempre cuidadoso e profundo em seus comentários, consolidando a si mesmo um exímio contador de histórias. Seus textos são do calibre de um homem que fez da solidão e da aceitação da dor as suas parceiras, e que nos faz sentir suas vivências enquanto constrói um ambiente que seja confortável para quem lê. Nos sentimos íntimos, mas impotentes ao saber que tanta coisa te tenha sucedido e talvez nunca deixemos de ser apenas isso: espectadores. É um sentimento agridoce, ler um texto que me faz sentir tão bem quisto, mas que fale de coisas tão melancólicas. É como comer dar a última garfada no nosso prato favorito.

Shaolin, eu peço a você com toda a minha alma: não deixe esse peso ser a âncora que vai te levar pro fundo de um mar de sofrimento. As coisas não precisam ser assim. Quem te fala agora não é mais Argus Stoneheart, o autor, mas Argus Stoneheart, que tentou dar um fim a si mesmo 2 vezes justamente por negligenciar a si mesmo e disfarçar o que sentia. Seus textos me lembraram da época da minha depressão, e eu me vi nas suas palavras. Por isso, eu peço que você procure ajuda quando for difícil demais, e que cuide de si mesmo. Quando eu percebi que minha situação estava caminhando para um beco sem saída, eu resolvi aceitar ajuda e mudei de direção, e hoje afirmo que estou no caminho da construção da alegria. Muitas vezes eu passo por situações difíceis, me canso, fico triste e choro inconsolavelmente, mas no fundo, eu continuo sendo uma pessoa feliz. Isso que é a plenitude da vida, saber que a alegria não é como o oxigênio, sempre presente. Ela mais se assemelha ao Sol. Às vezes tímido, às vezes some, mas não importa o quão escura sejam as nuvens, sempre vai haver um Sol brilhando acima delas.. Você vai precisar quebrar o seu orgulho, e fazer coisas que pensou que nunca faria, mas quando você finalmente sai dessa fase, você vê que valeu a pena. 

Eu não posso te tocar, não posso te abraçar, não posso pegar seu rosto em minhas mãos e enxugar suas lágrimas, e talvez fora desse blog nem nos tornemos amigos, mas eu quero dizer uma coisa a você: eu sinto suas palavras, eu vejo sua carga, eu compreendo sua trajetória, e eu admiro sua capacidade. Espero que em breve, pelo menos uma vez você seja capaz de escrever um texto que não me faça sentir mais a sua dor, mas a sua superação.

Você sobreviveu a um total de 100% de todos os seus dias ruins até agora. Você é Shaolin, o matador de porco, e saiba que Argus Stoneheart para sempre vai estar marcado por ti.

Por Argus Stoneheart


3 comentários:

  1. Querido Argus, os seus textos acabam sendo um dos meus preferidos sempre. Não falo de técnicas tão bem dominadas, mas porque você consegue exprimir muito do que sinto, vivo e não falo, mesmo em minhas crônicas que parecem muito expostas, há mais do que se vê sobre aquela superfície não tão rasa assim. Como pude ler agora sobre algo que você menciona no texto e que, estranhamente, combinamos em número. Aprecio a sua sensibilidade, tal qual um capricorniano, que executa tarefas com maestria, mas por dentro há um turbilhão de coisas a serem ditas, que ama, mas é discreto e tem dificuldade de se mostrar vulnerável, como você mesmo mencionou em um de seus textos. Você será um grande escritor. Grande. Excelente texto, como sempre. Meus sinceros parabéns, quando crescer quero escrever como você.

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  2. Argus, seu texto é um dos que mais me envolveram até agora. Você tem uma escrita extremamente sensível e consegue sentir a dor do outro através do peso das palavras. Muitas vezes, quando escrevemos sobre nós mesmos, não conseguimos enxergar certas coisas. No entanto, como leitores, é impressionante a nossa capacidade de interpretação e de ir além em nossas visões subjetivas. Parabéns pelo texto!

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  3. Querido Argus, gostaria de parabenizá-lo pelo seu texto. É palpável a sua entrega a cada semana. Eu venho aqui procurando, primeiramente, pelo seu texto porque sei que ele será a pancada mais forte que tomarei pela manhã. Adorei o que o destino aprontou, colocar você, exímio escritor, para comentar o texto do Shaolin, que também é excelente. Eu agradeço muito pela sua extrema sensibilidade com o Shaolin. Já tinha notado o quanto algo o prendia no mundo das aparências, o quando isso o machuca. Também quero ter a oportunidade de ler que ele está conseguindo se livrar das grades que o aprisionam.

    Por fim, gostaria de dizer, Argus, que o seu texto consegue ajudar não só o Shaolin, mas todos os outros autores que o estão lendo. O sol realmente há de brilhar, mesmo que nuvens nos coloquem medo. Muito obrigado por dar sempre o seu máximo aqui, Argus.

    Abraços.

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