Já que batia na pequena porta que havia à sua frente, Benedito deveria estar esperando
alguém. Ou pelo menos achava isso. Era culpa daquele esquecimento maldito que vinha lhe
incomodando por anos. Passados alguns minutos, um som de calçados vai tornando-se cada
vez mais nítido e incômodo, até que cessa ao mesmo tempo em que a portinhola se abre. Sem
pressa alguma, um jovem abre a porta e proclama as seis palavras que justificavam seu
trabalho.
– A Superintendente está a sua espera. – apontando para o caminho ladrilhado.
Apesar do estranhamento com a situação, o homem segue na direção que devia.
Estava atordoado demais para reclamar. Assim que entra no casarão em que tinha o encontro
marcado, Benedito é obrigado a enfrentar uma fila quilométrica. “Acho que essa senhorazinha
deve ser importante”. Quando sua vez é anunciada, ele, timidamente, levanta-se e entra na
sala.
– Que belo dia, meu caro. Como vai? – perguntou a elegante mulher dos cabelos
crespos que sentava na poltrona à sua frente.
– Tudo bem. A senhora me desculpe por falar, mas tô sem entender o que tô fazendo
aqui.
– Se acomode nesse sofá que eu te explico tudo. Ah, e faça o favor de esquecer o
senhora. Pode me chamar de Vera. – riu. – Então, o senhor entrou no sistema essa manhã,
especificamente às 10:47, e como temos uma longa lista de pessoas, já nos dispusemos a
transferi-lo para o seu cargo.
– Que sistema é esse, Vera? Cargo?
– Ah, o sistema da nossa empresa, meu caro. Você é oficialmente o 145.844º
contribuinte da Pós-Vida Ltda. Separamos para o senhor um super trabalho como analista do
setor de Relatos Urgentes do Trabalhador Rural, que ultimamente tem sido nossa divisão mais
ocupada.
– Empresa Vida Após a Morte? Mas dona Vera, trabalhar num lugar desse deve dar
bastante azar. Ainda quero viver por muito tempo, ver meus netos casando, visitar a capital
com meu marido.
– Eita, nem recomendo. Rio Branco nem é tão bonita assim. Temos algumas fotos que
o senhor pode dar uma olhada. A não ser que queira perambular por lá no seu horário de
almoço.
– Me desculpe, dona Vera. A senhora está falando grego.
– Vamos ver assim. Após sair da festa de comemoração do seu 87º aniversário, o
senhor voltou a trabalhar nas plantações de cana. Mas infelizmente, ao tropeçar numa pedra,
sua cabeça foi de encontro com o facão e o senhor morreu.
Mais atordoado do que nunca, Benedito respirou fundo e fitou a Superintendente com
uma expressão tranquila. Não era culpa dela. Que onda era essa que ele tava?
– Tudo certo, Benedito? Obrigada pela compreensão e pode sair por essa porta aqui,
que a nossa equipe vai te levar para sua estação de trabalho. O senhor já tem que começar o
Treinamento. Não podemos parar. Foi um prazer! – disse Vera, quase que expulsando-o da
sala. –Próximo!
Ao se dar conta de tudo que havia acontecido, surpreendentemente, Benedito parecia
tranquilo. Estava finalmente no paraíso. Pelo menos, era o que a televisão dizia.
Alice Moon
Muito bom como se refere ao tema. A narrativa ficou facil de entender, flui, acredito que tenha perenidade, mas esperava mais do final. Não entendi " o que a televisão dizia".
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