Há uns anos, recebi aqui em casa o meu pai, o seu Túlio Chagas. Ele apareceu de surpresa
dizendo que iria passar só uns tempos e acabou ficando bem mais que o combinado, mas a gente
releva, já estava acostumada a não ser ouvida. Como era uma casa estreita, à medida que ele foi
se instalando, começou a querer realizar pequenas alterações estruturais na residência, a fim de
ficar mais confortável para comportar nós dois. Conforme eu fui realizando essas mudanças,
notei que as modificações foram certeiras. O ambiente se tornou mais iluminado, organizado e
confortável. Passei bons anos me perguntando como eu não havia tomado essa atitude antes.
Infelizmente meu pai não está mais entre nós, mas a herança deixada em minha casa, por
enquanto, ainda levo comigo. Digo por enquanto, pois, no meio do caminho, conheci um cara: o
Dilan Russo F. Ele parecia perfeito pra mim e ainda agradava a maioria das minhas amigas.
Relacionei-me com ele por um tempo, confesso que me fez muito feliz apesar dos pequenos
problemas. No entanto, em conseqüência do desgaste natural da relação, acabei me apaixonando
pelo seu melhor amigo: Miguel Mendes.
Miguel nunca foi flor que se cheire. Sua péssima fama era bem conhecida na cidade. Mesmo
sabendo disso, resolvi entregar-me às suas investidas, já que, tive o apoio das mesmas amigas
para que eu seguisse em frente, mesmo sendo inapropriado. Elas diziam que eu tinha que fazer o
que era preciso pra alcançar a minha felicidade e a solução mais fácil, para tal, seria eu assumir
o Miguel, num grande acordo: com elas, com minha felicidade, com tudo.
Pois bem, tratei de dar um belo pé na bunda no Dilan Russo e, para estancar a sangria, achei que
a solução mais fácil seria ir logo viver com o Miguel, dividindo a mesma casa. Acabei me
casando posteriormente. Agora, após quase dois anos juntos, percebi o tamanho da besteira que
fiz com a minha vida.
Lembram das obras do meu pai? Mesmo eu tentando explicar o quanto eu havia me apegado
àquelas modificações em minha casa, ele insistia em fazer uma nova obra. Não entrava na
minha cabeça o porquê, uma vez que as idéias dele se tratavam de um regresso absoluto de tudo
que eu e meu pai fizemos. Dizia que pensava em ter filhos e, por isso, deveríamos diminuir os
cômodos para fazer outro quarto, que o cachorro fazia muita sujeira e precisávamos de pisos
mais escuros. Desculpas tinham inúmeras para cobrir o verdadeiro motivo: capricho pessoal.
Não sei ao certo porque ainda não o expulsei de lá. Talvez seja o comodismo, ou o amor falando
mais alto. Afinal, é um casamento, deveríamos saber como resolver as coisas em conjunto. É
por acreditar nisso que eu vou lutar. Eu não vou me calar mais nas nossas conversas no fim do
dia. Não deixarei mais que ele insista em dizer o que é melhor pra mim. A casa é minha, e as
decisões também devem ser.
E eu já decidi: não à reforma.
Renata Milena
Muito bom. Saiu do lógico, do que eu esperava dos textos. Foi claro mesmo sem referir-se diretamente ao assunto. Tem perenidade, cidadania, ultrapassa os limites do acontecimento. Parabéns.
ResponderExcluirMuito bom texto! Gostei da fuga do óbvio e de como estabelece uma lógica de reflexão no leitor.
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