“É preciso lembrar”

 Recordo-me de ter ouvido que seria preciso esquecer para, de fato, ser possível lembrar ou

criar lembranças, “quem nunca se esquece, vive o mesmo dia, todo dia”, por isso, é

necessário o esquecimento. Por ironia ou não, isso me engatilhou a pensar em outra fala

desse emissor que dizia: “é preciso lembrar”, mas, como voltar a um momento que parece

que já apagou-se de sua memória? Diria então, que assim será o meu texto, uma breve

lembrança de uma tarde ensolarada em que tive minha primeira aula com esta disciplina.

Era a primeira semana de faculdade e ainda podia sentir a emoção de estar começando a

estudar, finalmente, na UFF, mesmo que em modelo remoto. Comecei dando o “Boa tarde,

professor!” mais contente que pude e me deparei com uma rica “discussão” sobre Freud.

Foi muito inusitado, pois não imaginava ter uma aula que falasse de psicologia na faculdade

de Jornalismo ou que eu pudesse entender teorias tão complexas, mesmo que rasamente.

Surpreendente, para bom, claro.

Essas teorias freudianas diziam respeito a dois princípios: do prazer e da realidade. A

primeira dizia sobre a involuntária busca humana pelo prazer, onde a fuga da dor e do

sofrimento são sempre irmãs gêmeas. A segunda, mais voltada para a realidade, como o

nome mesmo diz, se contrasta diretamente ao primeiro princípio, onde um desejo poderia

sim, ser adiado e recalcado, sem maiores problemas presentes, mas somente no futuro

seria possível saber se foi evitada uma grande dor ou conquistado um grande prazer.

Levando para o primeiro parágrafo com a frase dita por tal emissor: "é preciso lembrar”,

acabo de perceber que existiu um outro tópico muito importante dito pelo professor, os

traumas. Sim, esse era tema daquela ensolarada semana, muito irônico, não? Pois, os

nossos traumas demonstram de forma explícita ou implícita tudo aquilo que não

conseguimos lidar de forma consciente. Isso me incomodou de tal maneira, que me

questionei, porque me recordar de algo que me causa tanto desconforto?

Porém, para a meu espanto, a resposta era mais simples do que imaginei:

Nunca saberia o que era sentir alegria, se nunca experimentasse a dor, e por assim dizer,

nunca amadureceria como ser humano, se toda vez que me magoasse, escolhesse me

proteger da minha própria tristeza e recalque.

O esquecimento seria o fim.

Estrela do Mar