quinta-feira, 18 de março de 2021

O gran finale

Eu vejo um baile de máscaras. Todos os dias. No ônibus às seis da manhã, na escola às sete, no

trabalho às duas da tarde e durante o resto do tempo. Quando me olho no espelho ou quando olho o

outro passar por mim. Nesse baile não toca música, só o compasso acelerado do relógio marcando a

hora que ele começa e termina.

Quando saio de casa coloco a minha máscara. Não sou fraca, não tenho inseguranças, não tenho medo

e não fico triste. Sou produtiva conforme o capitalismo requer de mim. Volto para casa e produzo mais

um pouco, pois como falam, o segredo do sucesso é trabalhar. Dane-se meu cansaço. Dane-se o seu

também. Sabe o que fazer para melhorar? Compra um carro novo. Ah, compra um celular da moda

também. Gasta todo seu dinheiro, esse que você rala o mês inteiro pra ganhar, em coisas supérfluas e

obsoletas. Ostenta elas. Posta nas suas redes sociais. Mostra o quão feliz você está mesmo que não

tenha dormido oito horas essa noite, ou que não tenha tido tempo de digerir sua comida, mesmo que

esmagada em um ônibus por horas, mesmo que tenha acabado de ter uma crise de ansiedade no

banheiro do serviço. No final o ter é mais importante que o ser. E parecer ser e ter é mais importante

ainda. Afinal, não é por isso que estamos de máscaras?

Deixe que essa rotina massacrante desse sistema opressor dilua sua identidade. Dance conforme o

som do relógio. Enquanto o tic-tac marca o começo e o fim do baile está tudo bem. Só mais um dia. Só

mais uma semana. Só mais um mês. Mas o pior é quando ele marca o fim do espetáculo e você

percebe que não viveu. Tic-tac. Morreu mais um. Sem tempo para ascender. Só mais um palhaço.

Elipse

16 comentários:

  1. Elipse, adorei seu texto! Sinto uma energia muito boa e parecida comigo vindo de você. Inclusive escrevemos sobre- praticamente- a mesma coisa.
    Gostei muito, parabéns demais!

    ResponderExcluir
  2. Muito bom texto , elipse! Consegui sentir e entender perfeitamente seus sentimentos(ou o do palhaço).

    ResponderExcluir
  3. Elipse, gostei bastante a metáfora da máscara ao longo do texto. Consegui sentir todo o sentimento por trás da máscara e do que o espetáculo representa!

    ResponderExcluir
  4. Excelente ! Sua narrativa conseguiu trazer a rotina que vivemos de forma poética e intelectual ao mesmo tempo. Muito bom !

    ResponderExcluir
  5. Texto sensacional e tão verdadeiro! Parabéns, Elipse!

    ResponderExcluir
  6. ótimas referências. Simplesmente brilhante, atual e verdadeiro.

    ResponderExcluir
  7. Caramba, Elipse! Adorei o seu texto, muito bom mesmo! Consegui entender todos os sentimentos e visualizei o quadro perfeitamente! Parabéns!!

    ResponderExcluir
  8. Elipse, sou sua fã. Sério!
    Seus textos sempre me surpreendem positivamente, usando metáforas super interessantes para transmitir uma mensagem forte e impactante. Parabéns pelo seu dom <3

    ResponderExcluir
  9. Elipse, que texto incrível. Muita sutileza e criatividade para falar de um assunto tão delicado e tão presente na sociedade atual. Além disso, não é seu primeiro texto que vou destacar isso mas, percebo muita verdade na sua escrita. Parabéns!

    ResponderExcluir
  10. Elipse, gostei muito de como vc usa a metáfora com as máscaras, realmente observo que o "baile de máscaras" se encontra nas redes sociais! Parabéns, pela criatividade e atualidade presente no seu texto !!

    ResponderExcluir
  11. Elipse, mais um texto incrível! Adorei a construção com a rotina e as metáforas. Parabéns!

    ResponderExcluir
  12. Incrível o seu texto Elipse! As metáforas trouxeram muita riqueza pra sua interpretação. Uma reflexão impactante sobre a sociedade, construída de forma singular e bela pelas suas palavras. Parabéns!

    ResponderExcluir
  13. Elipse, amei o texto, como sempre. Acho que essa visão de como se você fosse o palhaço foi uma ideia narrativa muito boa! Adorei as referências que você usou e o jeito que você conseguiu descrever os sentimentos presentes no quadro! Parabéns! Beijos e abraços <3

    ResponderExcluir
  14. Elipse, amei o seu texto, como sempre. Afinal, sou sua fã declarada. Texto muito intenso, profundo e bem elaborado. Referências impecáveis e leitura muito fluida. Uma pena só é que eu me identifique tanto com ele rsrs quantos dias mais irão morrer até percebermos isso? Enfim...

    Beijos, Estrela!

    ResponderExcluir