Faz algum tempo que não vou ao mercado, desde que a vida se fechou lá fora — ou deveria ter se fechado —, mas eu ainda escuto as notícias sobre o preço do arroz ou sobre como mal dá pra comprar um frango inteiro ultimamente. É preciso parcelar o alimento como se parcela a paciência e organizar bem o que tem no armário da cozinha para ele não parecer tão vazio. E o engraçado é que Guedes disse que a inflação não está fora de controle, mesmo agora que nós temos uma lenda urbana em forma de nota de duzentos reais e vários outros problemas.
A lista é quase infinita, mas a questão é: um país de verdade não pode se alimentar com esperança e falas sem fundamento. Escutar que a inflação não está fora de controle não é nenhum consolo, principalmente quando “inflação” não é uma palavra presente no dicionário de muita gente. Foi só ontem que eu descobri o que isso realmente queria dizer. Mas comida, pelo contrário, é uma palavra tão conhecida que se desenrola pela língua com a mesma calma de quem acaba de acordar num domingo de preguiça e cada sílaba tem um gosto diferente quando pronunciada.
Gosto de saudade, de tristeza, de medo e de uma esperança quase extinta dentro do pote de sorvete sem sorvete e sem feijão, porque as compras do mês vão se reduzindo cada vez mais e a cozinha vai sobrevivendo aos poucos. Um país de verdade, de gente de verdade, de carne e osso e que tem necessidade de sobreviver mais um dia, não pode se alimentar das falas de alguém tão pouco confiável no jornal e sentimentos infelizmente não enchem o estômago. A inflação pode não estar fora do controle, mas há algum tempo a vida está. Faz um bom tempo que não vejo o dono do mercadinho da esquina sorrir também.
Seu texto ta maravilhoso, Todos, gostei muito da parte "cada sílaba tem um gosto diferente quando pronunciada". E que fofo seu meme!!
ResponderExcluirmuito obrigada, euridicie ❤
ExcluirEstá mesmo! Eu gostei de tudo, é muito real. Eu só quero dar bom dia e ver a pessoa sorrindo de volta, mas acho que mesmo quando a gente poder tirar as máscaras vai demorar até esses sorrisos voltarem. Abraços, o negócio é plantar tomate em casa!
ResponderExcluira ideia de plantar tomate em casa é tentadora mesmo, pena que dá sempre errado quando eu tento shjshjshjshj. e eu entendo isso, vivo comentando que sinto muita falta de ver gente, falar com gente e ver elas sorrindo e dando risada, mas a questão não são apenas as máscaras, mas tudo que tem acontecido nesses quase dois anos de pandemia. abraços também ❤
ExcluirSeu texto é tocante! É humanizado, sensível... Tentam diminuir nossas feridas com discursos ditos por alguém que não conhece de fato a realidade das famílias brasileiras hoje.
ResponderExcluirHá uma linha tênue entre o inominável e a safadeza misturada com covardia. Sempre mantendo a esperança de que chegará um dia onde não se pague 40 reais num pedaço de carne, mas é cada vez mais difícil caminhar num país onde Paulo Guedes é o ministro responsável por planejar a economia. Compartilho contigo a mesma experiência, faz muito tempo que não vejo o dono do mercadinho do sorrir, só em jogo do Flamengo mesmo... Parabéns pelo teu texto!!
ResponderExcluirQUE texto, parabéns!!! Queremos comida na mesa, como vc disse: sentimentos infelizmente não enchem o estômago.
ResponderExcluirObs: Essa sua foto criancinha tá a coisa mais fofa kkkkkkkkkk
Amei seu texto, sério. Acho sua escrita deveras brilhante. Essa parte em específico me tocou bastante: "Gosto de saudade, de tristeza, de medo e de uma esperança quase extinta dentro do pote de sorvete sem sorvete e sem feijão, porque as compras do mês vão se reduzindo cada
ResponderExcluirvez mais e a cozinha vai sobrevivendo aos poucos." Meus parabéns :)
Nossa, esse final pegou aqui. Teve um dia que me pegou de jeito, era um senhor no mercado, reclamando dos preços, que nos outros países não é assim...eu não teria nem forças para tentar debater o assunto. Tem gente agora até acreditando que pode se alimentar de fuzil, né ?
ResponderExcluirO título de começo já me impactou, amei o jeitinho família que conduziu seu texto, dói demais ver que a nosso relação com a comida não é mais a mesma, como você mesmo disse até aquela ansiedade que sentimos quando abrimos um pote sorvete para descobrir o que há dentro se perdeu, já era difícil o sorvete, hoje em dia quem dirá o feijão, é triste a situação...Parabéns pela crônica, amei de coração!
ResponderExcluirQue crítica maravilhosa! Do título ao meme seu texto tem um impacto muito grande, é muito bem desenvolvido. Ficou ótimo!
ResponderExcluirTomates, eu amei que no meme vc usou seu pseudo arrasouuuuu. Você falou tudo ,de repente inflação dá um nó na cabeça, mas fala comida que todos sabem o que é isso, e principalmente o quão ruim é a falta dela. De fato o que mencionou que não nos alimentamos de palavras, é a mais pura verdade, infelizmente o ministro parece achar que ser humano é só ele
ResponderExcluirAh... Que texto incrível! Da gosto de poder ter lido essa crítica, me sacia poder ver como você conseguiu estruturar suas ideias nessas linhas. Mas não me desce a garganta e nem me alimenta a forma que somos tratados, as poucas políticas que nos asseguram de pelo menos ter algo a mais no prato além do feijão e arroz, que ah! Nem isso virou realidade por aqui devido seu alto custo. É angu agora, e olhe lá porque daqui a pouco.........
ResponderExcluirAi, tomate! Seu texto está tão incrível! Como a Laranjenha falou, o final me fez refletir. Só quem ganha com todos esses preços altos são os grandões, os pequenos vendedores sofrem que nem a gente :(
ResponderExcluirO preço tá muito caro mesmo, todos amam tomates!! Ficamos tristes com isso, ao contrário dos caras lá de cima. Eles estando felizes me deixa extremamente chateado
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