Eu acordo de manhã e enquanto tomo café, penso: eu não tenho jeito. Vou tomar banho,
pensando nos meus desejos e quando saio e olho para o meu corpo e o meu reflexo, suspiro.
Realmente não tenho jeito.
Fico parado no meu quarto, usando o computador de todas as maneiras possíveis para não
pensar em nada. Como se o mundo fosse infinito, como se as horas não passassem, como se
eu não soubesse o que eu tenho que fazer, eu continuo afundando na minha própria sujeira.
Eu abro e fecho a minha mão para ver se eu ainda sou humano, se ainda estou aqui, se eu
ainda consigo forças, mas eu não sinto nada diferente.
Tento me distrair, lendo, escutando música, vendo séries, caminhando, passando o tempo
com os amigos, mas é difícil. Apesar de gostar de todos, me sinto segurando um peso nas
costas, um barulho que diz bem baixinho como um murmúrio: ingrato. Eu concordo, gente
que não tem jeito como eu não aprecia direito nada disso.
Eu escrevo diálogos, textos e poemas, mas para escritores que não tem jeito, não adianta
tentar. As palavras vão sendo marteladas e a mente vai aceitando como se fosse verdade.
Mesmo recebendo elogios, não consigo aceitá-los, mesmo se eles fazerem sentido
racionalmente, no fundo do meu coração eu não concordo. Fico imóvel, esperando alguém ou
algo para me ajudar, me mostrar um caminho, uma escolha, qualquer coisa... e nunca vem
nada.
Mas, às vezes, só às vezes, em dias raros quando eu consigo respirar fundo e escapar de toda
a espiral tóxica de pensamentos negativos, quando a minha indiferença se transforma em um
propósito radiante e filosófico, quando eu me sinto conectado com o mundo, penso comigo
mesmo: gente como eu não tem jeito, e tudo bem. Gente como eu não precisa ter jeito.
Acho que vou pedir uma pizza.
Asa Monstro
Asa, e se eu te disser que sinto igual? Acho que todos nós temos um pouco disso... Uns mais, outros menos; mas sempre tem aquele momento de insight em que percebemos nossa "inutilidade". E pior! quando percebemos que reclamamos demais enquanto temos tudo? A conclusão sempre é: Ingratos. Mas acho que, no fim das contas, não precisa mesmo de um propósito extraordinário ou uma jornada heróica. Uma vez vi no Facebook (rs): "Assuma a sua insignificância e tudo será mais simples". Desde lá, penso que é isso mesmo. A vida se faz nos detalhes. E são eles que devemos aprender - porque não é nada fácil - a valorizar.
ResponderExcluirAté nisso, Bic? No fim, valorizando a vida e os detalhes sempre dá em pizza. Quer dividir um pedaço?
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ResponderExcluirSeu texto foi tão íntimo e sincero, Asa. Gostei muito!
ResponderExcluirObrigado, Euridicie! Estamos juntos!
ExcluirAsa, digo o mesmo que a Bic sobre esse sentimento de "inutilidade" (aliás, shippo kkkkkkk), mas voltando: Já parou pra pensar que o mundo existia antes da gente nascer e, depois da nossa morte, ele vai continuar existindo? No final, o que nós somos dentro desse grande universo? Sei lá, acho que a inutilidade já é uma característica do ser humano, antes apenas natural, agora até mesmo dentro da nossa sociedade. Nunca somos bons o suficiente. Nunca temos o suficiente. Nunca é o suficiente. No final, acho que só depende de nós mesmos se essa vida vai ter algum significado ou não, independente do que achem sobre a gente, a única coisa que vai importar é a nossa própria opinião.
ResponderExcluirhahahaha, obrigado pelo comentário, Melo. Tem uma frase de Camus que é assim, de O mito de Sísifo: "como não entender que, nesse universo vulnerável, tudo que é humano e apenas humano adquire um sentido mais ardente?". Penso nisso várias vezes, tanto o mundo existindo antes e depois de mim e o que eu tenho com isso tudo. Só depende de nós mesmos para a vida ter significado, a gente precisa imaginar Sísifo feliz... mas é difícil né? Ainda mais quando nesse momento é como se a pedra tivesse rolado bem mais longe do que deveria ter rolado, esse texto foi exatamente esse momento e eu tentando lidar com isso. Uma pizza ajuda!
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