quinta-feira, 9 de maio de 2019

Sem lenço, sem documento

Sangue, suor e lágrimas para entrar. Passar pelos piores meses na vida de um estudante até o vestibular para, só aí, ingressar – ou não – no sonho: “A” Faculdade Federal. E então o discurso muda: “Hahaha, entrar é fácil. Quero ver sair.” E vem o ódio. Como esse desgraçado fala isso sem saber pelo que passei?
Originalmente, o que se pensa é que as matérias e professores o impedirão de concluí-la. A primeira semana passa e você fica confuso. Ué, não eram os demônios? Por outro lado, contente (porque calouro é um bichinho feliz, né). Apreensivos, o ser humano foi ensinado a sempre esperar pelo pior. E o pior vem.
Finalmente, aquilo que todos falaram, acontece. Mas não da maneira que imaginou. Por que o difícil não é sair e sim, manter. Manter a universidade, os estudos e os direitos em um país colapsado e doente. Um corte absurdo na educação no intuito de fazer os jovens reféns, com uma escolha a ser tomada pelas mãos de terceiros: ou estuda ou se aposenta. Escolha injusta e desnecessária.
E você chora porque o desespero está ali. A tristeza, cansaço e ódio, também. Como pode ser possível ter um POVO que incentiva o descaso com a educação? Como é possível um país que despreza os universitários dessa forma, reduzindo-os a maconheiros, vagabundos e depravados? Orgias na faculdade? Leva-me a UMA, por favor. Por favor.
Então, há revolta. Manifestações e assembleias. Vai para a rua. Tem movimento, tem suor e tem gente jovem reunida. Está pacífico. Trânsito caótico? Provavelmente, mas para haver mudança precisa, sobretudo, incomodar. E incomoda, percebe isso ao chegar exausto em casa. Dentre os comentários sobre as manifestações o que sobressai é: Desocupados, tinha que cortar mesmo.
Em um momento, o que se sente já não é mais revolta. Na verdade, ‘tá verdadeiramente puto. A população está nesse nível de alienação para concordar tão cegamente com qualquer merda que aquele energúmeno propõe, a ponto de desejar uma piora? Você pensa e pensa. Será que esse pacifismo vai resolver? Essa cordialidade à la política da boa vizinhança vai servir de algo? É óbvio que quando a bomba estourar vai ser em cima de nós. Literalmente.
De repente enxergo tudo em vermelho. Afaste de nós esse cale-se. Mas se for preciso sangrar, que assim seja.
Capitu Oblíqua

7 comentários:

  1. ESSE FINAL, MEU DEUS!
    Acredita que eu sonhei esses dias com essa música do "Cale-se"? Certeza que foi por causa de toda essa situação caótica.
    Gostei muito do texto, de verdade. Acho que a única crítica que eu tenho pra fazer é em relação ao foco narrativo ao longo da crônica. No primeiro parágrafo você usa o verbo "´Passei", em primeira pessoa. Aí depois tem "Vai pra rua" e então "Tá verdadeiramente puto". Confesso que isso me deixou um pouquinho confusa

    "Orgias na faculdade? Leva-me a UMA, por favor. Por favor."
    SE TE LEVAREM ME CONVIDA TBM, EU QUERO
    Beijos <3

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    1. Este comentário foi removido pelo autor.

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    2. ~Meu deus eu to em choque KKKKK só vamo~
      Enfim, tentei fazer um narrador oniciente e acabei usando a primeira pessoa algumas vezes. Pode ter dado merda kkkkk obrigada por sinalizar

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  2. Texto bom, final incrível!!! A única coisa que tenho a dizer é sobre a frase "Apreensivos, o ser humano foi ensinado a sempre esperar pelo pior." Não seria "Apreensivo, o ser humano..."? Deve ter sido falta de atenção, porque o restante tá bem bom, mesmo

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  3. Oi, Capitu. Gostei muito do seu texto. Engraçado que nós tivemos a mesma ideia de adicionar Chico Buarque no texto. Só tenho uma observação, no penúltimo parágrafo você abre aspas e não as fecha.
    Abraços!

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    1. Oi, Jussara. Você não está falando da apostrofe no "tá"? Kkkkk Obrigada pela crítica!

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