Volta e lê de novo

As mulheres já abortam. Sem discussão. O aborto é legítimo pra mulher que não quer ser mãe. E eu posso provar. 

 Há alguns meses, a ex do meu primo resolveu por um fim na relação, deixando um filho, uma casa mal arrumada e um marido dedicado. E bota dedicado nisso. O casamento era banhado a cartas escritas por ele, jantares feitos, com muito amor, por ele também, presentes dele para ela e sexo. Ele nunca negava sexo. Tinha disposição pra dar e vender. Ainda que o dia não tivesse sido bom. Até pouco tempo, era assim que viviam. Até que ela,  milagro$amente, cansou. 

A relação estava muito chata, caindo na rotina. Era muita cobrança. Não há quem aguente, né? - diz, até hoje, aquela lá. Inclusive, usou isso como desculpa pra, na primeira oportunidade, ter arrumado um cara mais novo, com uma conta bancária mais avantajada do que estava acostumada. Usa isso como desculpa pra não ver o filho há mais de 3 meses, alegando que não tem tempo, que trabalha muito pra, mesmo assim, reverter a situação e usar isso como desculpa pra não pagar as pensões atrasadas. Ela marca de ver a criança e, quinze minutos antes da hora marcada, liga e diz que não vai mais. Quando o moleque fica doente, não pode levar ao hospital, está sempre presa no trânsito. Promete mundos e fundos e nem apareceu na Páscoa. Na hora de revirar os olhinhos sem se cuidar, foi bom, né? Chamar a responsabilidade pra si é que complica. 

Meu primo, coitado, trabalha tanto, mas tanto, que mal tem tempo pra ele. Desde que o casamento acabou, ele vive pro filho. Ele só ouve perguntas sobre o filho. Ele só compra roupas pro filho. Ele abriu mão de muita coisa pelo filho. Pra chegar uma vagabunda qualquer e ficar pagando de mãezona, nas redes sociais, quando leva a criatura pra comer na lanchonete e dá um brinquedo da moda. Mal sabem as pessoas do Facebook o quanto aquele menino implora pra ela dormir em casa. E ela, sem a menor cerimônia, vai embora sem que se saiba quando volta. Se é que vai voltar. Já não atende as ligações. Já não paga as pensões. Nem veio no aniversário do próprio filho, que meu primo organizou com tanto trabalho. É cansativa e solitária a vida do pai solteiro. 

E se você, meu leitor, está tão indignado com ela como eu imagino que esteja, volta o texto todo e lê de novo. Só que, dessa vez, troca os papéis. Bota o pai lugar da mãe e vice-versa. Ainda te parece absurdo? Vou te dar uma ajudinha: 

Os homens já abortam. Sem discussão. O aborto é legítimo pro homem que não quer ser pai. E eu posso provar... 

Tentando fazer com que o óbvio pareça mais óbvio, Heloísa Dandara